domingo, 13 de março de 2011

BOTA NO PAU

Num Supermercado da cidade, enquanto pagava os produtos comprados, ouvi a menina do caixa dizer a um colega embalador:
- Fulano foi mandado embora.
- Por quê?
- Ele faltou.
- Bota no pau! Bota no pau!
Estamos exatamente na semana pós carnaval. É fácil de supor ou admitir que Fulano, de algum modo, se cansou naqueles três dias, na volta ao trabalho algo o impediu, indisposição? Preguiça? Podemos continuar enumerando hipóteses, mas não precisaremos a causa com certeza.
Que bom, há uma consciência de direitos nessa rapaziada que trabalha onde encontra o que fazer, não existe chance de escolha. Embalador? Colocar em sacolas as compras do freguês, depois no carrinho de rodas desenvoltas que consomem um mínimo de suas energias; o dia inteiro olhar para muitos carrinhos cheios, às vezes cheios de guloseimas, que seu salário mínimo não dá para comprar.
Não os vejo melancólicos ou possuídos de outro sentimento que lhes possa roubar o ânimo. Cruzam um pelo outro, para lá e para cá. Quando acontece de alguém ser mandado embora, a solução está pronta: bota no pau.
É tão fácil assim botar no pau? Ótimo ser consciente dos próprios direitos. Fiquei me perguntando se igual consciência existe quando se trata dos deveres. Sem falar que muitos outros direitos foram passando despercebidos, quando sua mãe pode ter dormido na porta da creche e ainda não ter conseguido vaga para que estudasse, quando a escola em que frequentou as primeiras séries era meio ao ar livre ou em ambiente absolutamente improvisado, não tinha merenda escolar ou era escassa; a(o) professor(a) estava mal vestido e desmotivado, mesmo assim não botou no pau e não disse nada.
A partir da quinta, chegou a oitava série, não lhe ministraram ensinamentos cívicos, ensinamentos práticos ou capazes de visualizar uma profissão, foi levando... mas recebeu um certificado de conclusão. A certo tempo, ouviu em casa, muito mais provável que da mãe, um alerta: você já está com 15 (16, 17) anos, vou tirar seus documentos para você trabalhar.
Pode ser que tenha passado a freqüentar “o segundo grau” à noite. Até que vai às aulas, mas trabalha no supermercado até 18 h. Sem jantar, (paga por aquele salgado brilhante de gordura) toma o rumo da escola, quem sabe sem portar sequer um caderno. Não está preocupado. Costuma ser aprovado assim mesmo.
Os direitos que lhe assistem, todos consignados na Constituição e nas Leis, formam com ele trilhos, convivem paralelamente, mas se ignoram.
Mas botar no pau, isso ele acha que sempre pode. Tenha ou não direitos, tenha ou não cumprido seus deveres. Na sua concepção há sempre um advogado (do Sindicato?) disposto a propor uma Reclamação Trabalhista Ainda pode encontrar julgadores com idéias retrogradas que não querendo examinar a fundo o pedido, seguindo a idéia geral, no mínimo dão trabalho ao Reclamado, quando não lhe impingem injustas condenações, sob o pretexto de que no Direito do Trabalho é assim.
Bota no pau! Bota no pau sim a desigualdade, a injustiça, a indiferença e tudo que não vislumbra na pessoa o potencial do qual é dotado e que, por exemplo: debaixo do uniforme azul de um(a) embalador(a) pode estar alguém cuja missão social e humana ultrapassa a tarefa da qual se ocupa e que pode ser desempenhada por outros que a ela mais se adequam por diversas circunstâncias ou condições desde as físicas às psicológicas.
Bota no pau a sociedade que dorme, que se acomoda, que esquece a ética e que o cuidado se impõe como pressuposto maior do alcance de todos os direitos... sem o que “a criação vai continuar gemendo em dores de parto”. (CF 2011).

Marlusse Pestana Daher
domingo, 13 de março de 2011 - 10:03:28