No último mês de outubro, o Banco Santander premiou professores
universitários de cursos de Economia e Administração que integram o tema da
sustentabilidade em suas disciplinas. A cerimônia de entrega do concurso
Práticas em Educação para a Sustentabilidade teve abertura de Marina Silva. Com
30 anos de vida pública e muitos importantes “ex” no currículo – senadora,
ministra e candidata à presidência da República -, Marina reiterou seu talento
também como disseminadora “da ideia cujo tempo chegou”. Segundo ela, é na
educação, afinal, que o mundo deve buscar resignificar-se para a crise
civilizatória instalada no planeta.
Educação e liderança para a sustentabilidade nas empresas foi o tema da
entrevista exclusiva que Marina Silva concedeu à Ideia Sustentável na
ocasião.
Ideia Sustentável: A senhora costuma
dizer que o mundo carece de “ideais identificatórios”. Na sua opinião, a
sustentabilidade já representa um ideal, hoje, nas empresas e no mundo
corporativo?
Marina Silva: Acredito ver isso nas pessoas, em primeiro
lugar. Pessoas virtuosas criam instituições virtuosas. Aos poucos, os projetos
identificatórios vão para as empresas. Os ideais se transformam em projetos. É
bom quando isso adquire sentido transversal, que não seja só uma atividade ou
ação dentro das corporações, mas uma cultura de sustentabilidade. Cada vez
mais, as pessoas impingem essa visão na cultura das empresas. E já temos alguns
exemplos, no Brasil e no mundo – mais do que discurso, muitas já se esforçam
pelo sustentável.
IS: De que maneira acredita que as
empresas podem envolver e educar lideranças para a sustentabilidade?
MS: A principal ferramenta é liderar – e ensinar – pelo exemplo. Se for
discursivo, o apelo não tem a mesma força que o exemplo, de assumir atitudes.
São práticas: desde tratar corretamente os resíduos, ter um envolvimento
respeitoso com comunidades locais, uma atitude correta no uso da energia. É
preciso fazer algo que traduza esses valores, tanto no próprio tecido da
empresa como nos produtos ou serviços que ela aporta à sociedade.
IS: A senhora acredita que algumas
empresas já tenham valores estabelecidos a ponto de transformar o padrão mental
para ajudar a promover a revolução civilizatória de que necessitamos?
MS: Começam a surgir empresas com esse compromisso, de que o dinheiro não é
apenas um fim em si mesmo, mas uma ferramenta para se construir um mundo e vida
melhores. Essa é a grande mudança de padrão civilizatório. Não se pode mais
produzir e consumir, produzir e consumir. Precisamos compreender que temos um
mundo limitado, portanto, ser criativos. Enquanto há limites para o ter, não há
para o ser, nem para generosidade, cooperação e erudição. É essa a cultura da
sustentabilidade que precisa fazer parte da visão e do objetivo das empresas.
IS: Na sua vida política, a senhora
se aproximou de lideranças empresariais, como Guilherme Leal (presidente do
conselho da Natura) e Ricardo Young (ex-candidato ao Senado e vereador eleito
da cidade de São Paulo). O que empresários trazem de novo à visão atual da
política?
MS: O mais importante é que, para estas pessoas, meio ambiente não é uma
estratégia de propaganda, mas a narrativa de um compromisso de vida. Eles
correram e ainda correm riscos ao assumir essa bandeira no cotidiano de suas
vidas e empresas. Fizeram isso em um tempo em que não havia glamour para o tema
da sustentabilidade. São verdadeiros pioneiros no fazer e no dizer.
IS: Seria possível citar exemplos ou
valores de algumas empresas que mereçam ser replicados?
MS: Acho difícil citar especificamente uma empresa, corre-se o risco de
parecer propaganda. Hoje, o que se tem de diferente é um compromisso que foi
transformado em cultura, ainda que em pouca quantidade no Brasil e no mundo.
Cada vez mais, no entanto, isso se constitui enquanto tendência e processo de
retroalimentação. Os pioneiros mostram que é possível fazer diferente. Então, a
opinião pública demanda mais do que simplesmente um produto sanitário,
estético, técnico ou de valor financeiro. Passa a querer coisas que estejam
associadas a valores, que são intangíveis, mas igualmente importantes para se
constituir a qualidade de um produto.
IS: Ao seu ver, a exigência do
consumidor promoverá essa mudança nas empresas?
MS: Como falei, trata-se de um processo de retroalimentação, não existe via
de mão única. Os que se dispõem a liderar pelo exemplo mostram, em várias
dimensões, que é possível um produto integrar valor econômico, social,
ambiental e cultural. E o consumidor que busca um consumo admirável e
sustentável demanda produtos que fazem com que aqueles que ainda não estão
comprometidos com esta agenda, tornem-se. Existem duas formas de entrar nesse
esforço: pelo coração ou pela razão. Há aqueles que estão de coração. No
entanto, outros enxergam, pela tendência, “uma ideia cujo tempo chegou”, como
dizia Vitor Hugo, e acabam seguindo. Penso como o poeta Thiago de Mello: “Não é
preciso se preocupar com o novo caminho, basta uma nova maneira de caminhar”.
Aqueles que são pioneiros nessa maneira acabam trilhando um novo caminho para
servir a todos.
* Publicado originalmente no site Ideia Sustentável. Autor da entrevista.