segunda-feira, 5 de agosto de 2013

AI PALAVRAS

                                                                                                                Verba volant, versicula ficat”

Formamos uma imensa Torre de Babel. Vozes se confundem num turbilhão tecnológico em nossos dias e, as palavras, confusas, ficam perdidas, aladas em campos virtuais, minados por pessoas que as desconhecem ou simplesmente ignoram o poder que delas emana.
Há ainda quem se lembre dos ensinamentos dos nossos pais: “A palavra do Homem é tudo”. Não era preciso assinar nada, nem ter acordos meticulosamente registrados em promissórias e recibos, muito menos, cartórios cobrando preços extraordinários para manter a palavra.
Acordos se firmavam com honra, pactos eram formados com o gesto de apertar as mãos, fechando não apenas acordos, mas criando laços de amizade que percorriam por toda uma vida.
Mas a banalização tornou-nos seres humanos conspurcados ao crime de pecar pelas palavras: elas saem desarvoradamente, numa velocidade frenética e doa a quem doer, punhal cortante sociedade adentro.
A vida transcorre numa naturalização destemida. Tudo que transpassa para a tela do computador é endeusado, copiado, repetido ou compartilhado, como se passássemos a ser desconhecidos de nós mesmos. Virtualmente, posso ser o que concretamente não me é permitido, mas, navegando no espaço aberto, utilizo-me das palavras que ferem e deixo transbordar o fel do egoísmo, não amando o outro como se fosse eu mesmo.
Como se não bastasse, as redes sociais estão disponíveis para esse emaranhado de registros que deságua nas duas caras da moeda: “- Falei mal de você mesmo, mas deletei, e daí?”
Passamos a não nos importarmos mais com o outro, somos barreiras nas entranhas do ego, corroendo todos os órgãos que ainda nos faziam apenas seres humanos.
“Ai palavras! Que estranha potência a vossa!” Como serás daqui a algum tempo? Úlcera dilacerante ou mel lambuzando línguas encantadas?
Cabe-me apenas passar pelos mesmos caminhos de nossos pais. Não deixar morrer velhos ensinamentos é a grande arma para liderarmos a (re)volta das belas palavras contra o torrão amargo do individualismo intolerante.
Fabiani Rodrigues Taylor Costa
Formada em Letras, Especialização em Literatura Brasileira e Gestão Escolar
Escreve no blog: literatuandopiuma.blogspot.com


MÊS VOCACIONAL - SEMANA DA FAMÍLIA

Transcrevo abaixo um trecho da exortação apostólica do Papa João Paulo II sobre A FUNÇÃO DA FAMILIA CRISTÃ


 LUZES E SOMBRAS DA FAMÍLIA DE HOJE  
Necessidade de conhecer a situação
4.Uma vez que o desígnio de Deus sobre o matrimónio e sobre a família visa o homem e a mulher no concreto da sua existência quotidiana, em determinadas situações sociais e culturais, a Igreja, para cumprir a sua missão, deve esforçar-se por conhecer as situações em que o matrimónio e a família se encontram hoje(8).
Este conhecimento é, portanto, uma exigência imprescindível para a obra de evangelização. É na verdade, às famílias do nosso tempo que a Igreja deve levar o imutável e sempre novo Evangelho de Jesus Cristo, na forma em que as famílias se encontram envolvidas nas presentes condições do mundo, chamadas a acolher e a viver o projecto de Deus que lhes diz respeito. Não só, mas os pedidos e os apelos do Espírito ressoam também nos acontecimentos da história, e, portanto, a Igreja pode ser guiada para uma intelecção mais profunda do inexaurível mistério do matrimónio e da família a partir das situações, perguntas, ansiedades e esperanças dos jovens, dos esposos e dos pais de hoje(9).
Deve ainda juntar-se a isto uma reflexão ulterior de particular importância no tempo presente. Não raramente ao homem e à mulher de hoje, em sincera e profunda procura de uma resposta aos graves e diários problemas da sua vida matrimonial e familiar, são oferecidas visões e propostas mesmo sedutoras, mas que comprometem em medida diversa a verdade e a dignidade da pessoa humana. É uma oferta frequentemente sustentada pela potente e capilar organização dos meios de comunicação social, que põem subtilmente em perigo a liberdade e a capacidade de julgar com objectividade.
Muitos, já cientes deste perigo em que se encontra a pessoa humana, empenham-se pela verdade. A Igreja, com o seu discernimento evangélico, une-se a esses, oferecendo-lhes o seu serviço em prol da verdade, da liberdade e da dignidade de cada homem e de cada mulher.  
O discernimento evangélico 
5.  O discernimento realizado pela Igreja torna-se oferta para orientação que salvaguarde e realize a inteira verdade e a plena dignidade do matrimónio e da família.
Este discernimento atinge-se pelo sentido da fé(10), dom que o Espírito Santo concede a todos os fiéis, e é, portanto, obra de toda a Igreja(11), segundo a diversidade dos vários dons e carismas que, ao mesmo tempo e segundo a responsabilidade própria de cada um, cooperam para uma mais profunda compreensão e actuação da Palavra de Deus. A Igreja, portanto, não realiza o discernimento evangélico próprio só por meio dos pastores, os quais ensinam em nome e com o poder de Cristo, mas também por meio dos leigos: Cristo «constituiu-os testemunhas, e concedeu-lhes o sentido da fé e o dom da palavra (cfr. Act. 2, 17-18; Apoc. 19, 10) a fim de que a força do Evangelho resplandeça na vida quotidiana, familiar e social»(12). Os leigos, em razão da sua vocação particular, têm o dever específico de interpretar à luz de Cristo a história deste mundo, enquanto são chamados a iluminar e dirigir as realidades temporais segundo o desígnio de Deus Criador e Redentor.
O «sentido sobrenatural da fé» (13) não consiste, porém, somente ou necessariamente no consenso dos fiéis. A Igreja, seguindo a Cristo, procura a verdade, que nem sempre coincide com a opinião da maioria. Escuta a consciência e não o poder e nisto defende os pobres e desprezados. A Igreja pode apreciar também a investigação sociológica e estatística quando se revelar útil para a compreensão do contexto histórico no qual a acção pastoral deve desenrolar-se e para conhecer melhor a verdade; tal investigação, porém, não pode ser julgada por si só como expressão do sentido da fé.
Porque é dever do ministério apostólico assegurar a permanência da Igreja na verdade de Cristo e introduzi-la sempre mais profundamente, os Pastores devem promover o sentido da fé em todos os fiéis, avaliar e julgar com autoridade a genuinidade das suas expressões, educar os crentes para um discernimento evangélico sempre mais amadurecido(14).
Para a elaboração de um autêntico discernimento evangélico nas várias situações e culturas em que o homem e a mulher vivem o seu matrimónio e a sua vida familiar, os esposos e os pais cristãos podem e devem oferecer um seu próprio e insubstituível contributo. A esta tarefa habilita-os o carisma ou dom próprio, o dom do sacramento do matrimónio(15).
 A situação da família no mundo de hoje
6.A situação em que se encontra a família apresenta aspectos positivos e aspectos negativos: sinal, naqueles, da salvação de Cristo operante no mundo; sinal, nestes, da recusa que o homem faz ao amor de Deus.
Por um lado, de facto, existe uma consciência mais viva da liberdade pessoal e uma maior atenção à qualidade das relações interpessoais no matrimónio, à promoção da dignidade da mulher, à procriação responsável, à educação dos filhos; há, além disso, a consciência da necessidade de que se desenvolvam relações entre as famílias por uma ajuda recíproca espiritual e material, a descoberta de novo da missão eclesial própria da família e da sua responsabilidade na construção de uma sociedade mais justa. Por outro lado, contudo, não faltam sinais de degradação preocupante de alguns valores fundamentais: uma errada concepção teórica e prática da independência dos cônjuges entre si; as graves ambiguidades acerca da relação de autoridade entre pais e filhos; as dificuldades concretas, que a família muitas vezes experimenta na transmissão dos valores; o número crescente dos divórcios; a praga do aborto; o recurso cada vez mais frequente à esterilização; a instauração de uma verdadeira e própria mentalidade contraceptiva.
Na raiz destes fenómenos negativos está muitas vezes uma corrupção da ideia e da experiência de liberdade concebida não como capacidade de realizar a verdade do projecto de Deus sobre o matrimónio e a família, mas como força autónoma de afirmação, não raramente contra os outros, para o próprio bem-estar egoístico.
Merece também a nossa atenção o facto de que, nos países do assim chamado Terceiro Mundo, faltem muitas vezes às famílias quer os meios fundamentais para a sobrevivência, como o alimento, o trabalho, a habitação, os medicamentos, quer as mais elementares liberdades. Nos países mais ricos, pelo contrário, o bem-estar excessivo e a mentalidade consumística, paradoxalmente unida a uma certa angústia e incerteza sobre o futuro, roubam aos esposos a generosidade e a coragem de suscitarem novas vidas humanas: assim a vida é muitas vezes entendida não como uma bênção, mas como um perigo de que é preciso defender-se.
A situação histórica em que vive a família apresenta-se, portanto, como um conjunto de luzes e sombras.
Isto revela que a história não é simplesmente um progresso necessário para o melhor, mas antes um acontecimento de liberdade, e ainda um combate entre liberdades que se opõem entre si; segundo a conhecida expressão de Santo Agostinho, um conflito entre dois amores: o amor de Deus impelido até ao desprezo de si, e o amor de si impelido até ao desprezo de Deus(16).

Segue-se que só a educação para o amor, radicada na fé, pode levar a adquirir a capacidade de interpretar «os sinais dos tempos», que são a expressão histórica deste duplo amor.