sexta-feira, 23 de maio de 2014

MEU CRICARÉ

Nessa tarde, o quanto mais pude, em pé no cais do antigo porto, aproximei-me dele, meu Cricaré,  rio que desliza lentamente e faz curvas em  
verso e prosa decantadas, antes de chegar ao mar.
Foi a placidez de suas águas a lhe fazer valer o nome “Kiri Karé” que significa “rio de águas calmas”, na língua Tupi, língua cujo direito de uso como nossa, nos foi arrebatado. O pseudo descobridor impôs-nos o Português que mesmo sendo “a última flor do Lacio, inculta e bela” na expressão de Bilac, era a dele e não a que o povo indígena que aqui já habitava, falava de há muito tempo. Como continua manso e continua belo o meu rio!
Naquele exato momento, um pequeno barco a vapor passa à jusante singrando-o e deixando na superfície espelhada, ondulações semelhantes às marítimas que se desfazem ao esbarrarem de encontro a margem, junto a mata ciliar de verde intenso, do outro lado se contorcem como em remoinho, mas é curto o tempo do qual precisam para logo se recompor.
Quedo-me em contemplação, as águas que passam a cada instante não são mais as mesmas que vejo, mas outras que ao mesmo tempo tomam o espaço deixado, sendo substituídas por outras que chegam. É impossível distingui-las pela forma, ou origem, cor ou intensidade que demonstrem, prossegue acariciando-se com ternura, na mais absoluta harmonia, o caudal que não se cansa, não afrouxa o ritmo que ostenta, ansioso pela consumação plena do encontro com o mar,  momento de espetáculo que acontece na belíssima Barra Nova.
Quantas e quantas gerações já terão feito o mesmo que eu, já terão provado da mesma magia e desembocado em fascinação indescritível só possível, se o caminho empreendido é feito nas asas da poesia.
Certamente, é sempre um encantamento mirar tal paisagem que mão humana nenhuma será capaz de repetir e, se tenta, como é o caso de quem pinta um quadro, carecerá de outros elementos ou agentes que lhe deem suporte.
É a terra que produz toda matéria prima: da forma em madeira que recebe a tela, do pincel e da tinta, antes de a mão humana fazer surgir o retrato.
Não se pretenda, pois, que meu perdão perdoe, se direito tenho a tanto, quem egoisticamente constrói irregularmente, desfaz o que não pode refazer, ou impede a todos o direito de tal visão, mas igualmente, não me deixo atormentar por lembranças, meu rio de águas calmas! Entro e saio, parto e volto, mas se estou presente (mateenseando), com a sensação de que minha visão nunca se interrompeu,  faço absoluta questão te ver.

Marlusse Pestana Daher

Em São Mateus, 28 de julho de 2012

domingo, 18 de maio de 2014

O PORTO DE SÃO MATEUS

O navio apitou ao longe
e a cidade se agitou.
O Miranda ou o “Loid”,
fosse o que fosse,
sua chegada
era sempre uma festa.

Âncora ao fundo,
atracou a nave.
Surge o comandante,
alguém da tripulação.

Surgem também os Senhores,
ternos de linho branco
vestidos.
Damas em “taieur”,
chapéus na cabeça,
saltos finos de sapatos,
impecáveis.

Em terra, os Coronéis,
                  Alferes,
                  Majores,
                  Intendentes,
Por seu turno, os Prefeitos,
Interventores talvez.

Naquele tempo...
E dos porões,
emergem primeiro,
odores,
suores,
clamores
do negro que subsistiu.

Traz na pele,
A cor da não esperança,
Na cabeça,
A lembrança da terra de África,
                                dos gongos,
dos maculelês,
do tambor,
do tocador,
do estupor,
da terra árida,
causticante e deslumbrante,
sedenta, avarenta...
mas sua terra!

Estão acorrentados pelo pescoço,
ligados,
manietados.
Vão servir na plantação,
Nas casas dos Senhores,
Às Sinhás, às Aiás.
Mas há sempre luz,
Mesmo nas trevas.
E num recanto
de rio,
ou de fonte,
como astro,
nasceu Zoroastro.
Como nasceu?
na casa de farinha?
no paiol, quem sabe?
Na cabana,
nasceu Zé de Ana.

Seus avós foram escravos,
escravos seus pais,
eles mesmos escravos seriam
não fosse a bondade
(hodiernamente posta em dúvida),
de candidata a Rainha,
que assinando a Lei Áurea,
à sua raça inteira
para sempre,
liberdade deu.

E Zoroastro cresceu,
e Zé de Ana cresceu
e dos seus,
cada um aprendeu,
o folguedo da marujada.
E saíram cantando,
ensinando aos de depois,
embaixadas, prisões,
repetem até versos
de Gil a Camões.

Um tanto mais novo,
canta jongo o Geraldino,
pelas ruas desertas
do velho porto,
de ruas estreitinhas,
de casarões a morrer,
onde passeia meu pensamento
que exulta em rever
reabrir-se o largo do chafariz
de um menino
que permanentemente vela
e carrega
lata d’água na cabeça...

Com fé em Deus,
dias se foram,
mas dias virão
e o comércio vai  fervilhar de novo,
de novo, a população vai descer
e na curva do rio,
vai aparecer,
a mesma esperança
daquela
de quem espera e sempre alcança:
a meta,
a vitória,
a glória,
dos casarões,
dos luares,
dos lugares,
porque voltarão a soar hinos
e fará de novo a história,
o PORTO DE SÃO MATEUS[1].




[1] Este poema, escrito há mais de trinta anos, abre o livro OS ANJOS NÃO FAZEM ARTE.




EUCARISTIA

Ó que pão, ó que comida,
ó que divino manjar
se nos dá no santo altar
cada dia!

Filho da Virgem Maria,
que Deus-Padre cá mandou
e por nós na cruz passou
crua morte,

e para que nos conforte
se deixou no sacramento
para dar-nos, com aumento,
sua graça,

esta divina fogaça
é manjar de lutadores,
galardão de vencedores
esforçados,

deleite de namorados,
que, co'o gosto deste pão,
deixam a deleitação
transitória.

Quem quiser haver vitória
do falso contentamento,
goste deste sacramento
divinal.

Este dá vida imortal,
este mata toda fome,
porque nele Deus e homem
se contêm.

É fonte de todo bem,
da qual quem bem se embebeda
não tenha medo da queda
do pecado.

Ó que divino bocado,
que tem todos os sabores!
Vinde, pobres pecadores,
a comer!

Não tendes de que temer,
senão de vossos pecados.
Se forem bem confessados,
isso basta,

qu'este manjar tudo gasta,
porque é fogo gastador,
que com seu divino ardor
tudo abrasa.

(...)


In: ANCHIETA. Poesias: manuscrito do século XVI, em português, castelhano, latim e tupi. Transcrições, trad. e notas M. de L. de Paula Martins. São Paulo: Comissão do IV Centenário da Cidade, 1954

sábado, 17 de maio de 2014

NÃO SE VIVE SEM AMOR

Se você disser que não me ama, tem que me dizer mais de uma vez... Este é
o primeiro verso de uma das bonitas canções que canta o Rei. Exprime a perplexidade de quem não admite, não crê que possa não ser amado.

Concordo e acho que você também, com tal afirmação, pois, somos resultado de um projeto de amor, nascemos do amor de nossos pais, estamos destinados a amar e ser amados.

Foi  Me. Teresa de Calcutá quem disse: “ Em todos estes anos em que trabalho com os mais pobres, tenho entendido sempre mais que o pior dos males, não é a lepra, não é a tuberculose (nem a aids, acrescento eu) mas é a sensação de não ser querido de não ser amado"  pelos outros. Realmente, não podemos viver sem amor.

Não existe amor sem entrega, não existe amor sem a dor, é herança que o Cristo nos lega, sem amor nada tem valor. E quem não se extasia diante do poema que escreveu Paulo: se dos arcanjos a linguagem ensino e a caridade esta alma não povoa, serei igual ao bronze que ressoa, profano templo onde bimbalha um sino.

Como nos lembrou aquele tempo de uma  Campanha da Fraternidade um dos mais bonitos.  Quando nos depararmos diante do Senhor da vida, e Ele nos questionar dizendo, que estava com fome e não lhe demos de comer, nu e não vestimos, preso e não o visitamos... e perguntarmos quando e onde e  Ele nos responder que em todas aquelas figuras de marginalizados era Ele que se apresentava a nossa caridade, ao nosso gesto de solidariedade, de partilha e doação, estupefatos exclamaremos: mas...  ERAS TU, SENHOR?

Pois é, minha gente, importa que nos conscientizemos do grande corpo de Cristo do qual são componentes todos os homens, mesmo os que nos parecem menos dignos, os que estiverem mais disformes ou pela fome, pela penúria ou por qualquer outro detalhe, circunstância, e o pior, pelo pecado e que assim o  tornam irreconhecível, porque disforme.

É preciso aprender com Maria. Quer ter uma bússola segura em suas mãos, quer ter certeza de que está vivendo de forma agradável a Deus, imite Nossa Senhora.

Medite profundamente sobre a atitude que ela teve nas Bodas de Caná, quando ninguém lhe pediu absolutamente nada e no entanto estava atenta e percebeu a falta de vinho e o constrangimento que tal coisa ia causar  àqueles noivos e preveniu tudo, intercedendo junto ao Filho que operou o primeiro dos seus milagres, transformando água em vinho.

 Você se sentirá muito feliz, pode crer!


sexta-feira, 16 de maio de 2014

O SERVIÇO POR AMOR

A mesa do grande banquete da vida está sempre preparado  a espera de que nos disponhamos a entrar na sala e como filhos do mesmo Pai, sentarmo-nos à mesma mesa, comendo do mesmo pão.

Todos somos convidados. Ninguém pode, nem deve pensar que não faça parte do número dos convidados. Nosso Pai não faz como os homens da terra que ao fazerem suas festas, mandam cartões especiais para alguns apenas e não deixam entrar os que mais necessitam, os que estão verdadeiramente mais necessitados do alimento abundante.

Mas eis que o Senhor que preparou este grande banquete, ficou decepcionado, porque viu seus convidados darem desculpas as mais diversas, encontrarem diversos pretextos para não atender ao convite que lhes foi feito. Só que não sabem o que perderam.

Então ele chama os excluídos do convívio social, aqueles que ficam à margem da história que habitam os guetos das grandes cidades, que não são tidos em conta, que não são considerados e eles vêm, a sala do banquete fica cheia.

Particular impressão me causou o primeiro verso da última estrofe: revelai-nos a alegria do serviço por amor, imitando Jesus Cristo, vosso Filho e Salvador! É que, no Movimento Oásis, ao qual eu pertenço, a ordem é servir por amor. Sim, se deixarmos que o amor se aposse de nós teremos a maior satisfação em servir a quantos carecerem do nosso serviço e por isto mesmo, ainda é o Oásis que nos propõe, devemos valer o quanto mais possível, porquanto, quanto mais valermos, mais serviços seremos capazes de prestar.

São cinco os pontos do serviço, todos eles consistem em servir. O primeiro, servir a nós mesmos, isto é, tornando-nos capazes, desenvolvendo o máximo possível as nossas capacidades,  tornando-as realidade.
O segundo ponto, é servir estando atentos para os serviços que o mundo nos solicita, isto é, tendo atitude semelhante a de Maria em Caná, quando sem ser solicitada, percebeu a falta de vinho, o transtorno que tal falta causaria aos noivos e procurou prevenir. Assim devemos ser nós.
O terceiro ponto é servir tendo um grande espírito de humildade, não nos ensoberbecendo dos valores que possuímos, enfim, colhendo a magnífica lição que nos dá Jesus, quando diz: aprendei de mim que sou manso e humilde de coração. 
O quarto ponto é Servir a Deus e o quinto servir aos irmãos, todos os cinco pontos se entrelaçam, mas de forma particular estes dois últimos, os quais nos põem  mais uma vez, no contexto da atitude,  que destaca a advertência de Jesus de que tudo aquilo que fazemos ou deixamos de fazer ainda que ao menor dos nossos irmãos, é a Ele que fazemos ou deixamos de fazer.

Estejamos atentos para as atenções que se fizerem necessárias dispensar aos nossos irmãos em qualquer lugar ou hora, para não termos que exclamar desencantados naquele dia: mas eras Tu, Senhor?

Que Nossa Senhora nos ajude.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

SABEDORIA DO SIMPLES

Gente simples diz coisas maravilhosas! Quantas vezes nos maravilhamos com coisas ditas por crianças, coisas que têm graça e inteligência! pessoas sem letras também são assim. É que existe um Espírito do Senhor Deus dominando o tempo, assistindo com seus dons, iluminando e fazendo florescer.
       
Pedro, o Apóstolo Pedro, era como sabemos um rústico pescador, eufórico, tipo “pavio curto” como hoje se diz.  Lembram que foi ele quem cortou a orelha de Malco?  Aquele que estava no grupo dos que foram prender Jesus?  pois é, mas revestido da sabedoria divina, iluminado pelo Espírito Santo, o homem se transformou,   até em virtude do cargo que recebeu, Pedro foi o nosso primeiro Papa.

É dele o pensamento central da nossa fala de hoje e consta de sua primeira carta (4,9-10): “Praticai entre vós a hospitalidade, sem murmuração. Ponde à disposição uns dos outros, os dons que recebestes, mostrando-se assim, bons administradores da multiforme graça de Deus”.
       
Que maravilha, não é?!  já pensaram se todo mundo fizesse isto? praticar a hospitalidade sem murmuração, isto é aceitar  o outro em sua casa, poder chamar quem está dormindo ao relento,  ou não tem para onde ir: irmão, venha  pra dentro da minha casa, se acomode aqui, até que você se arranje, minha casa é sua.  “Ponde à disposição uns dos outros os dons que recebestes, aqueles  talentos que o Senhor nos deu, as qualidades, as virtudes, sim as virtudes que temos, tudo de que somos capazes no bem. 

São os  dons que devemos fazer multiplicar até como condição de ser admitidos a “ingressar no reino”, pois é deste modo que Pedro conclui: “mostrando-se assim bons administradores das múltiplas formas da graça de Deus”.
       
Santa Maria, Saúde dos cristãos, Rainha dos homens e Mãe da Igreja, faça que nossa vida transcorra na consciência de dever colocar a serviço do Reino por meio dos  irmãos, os dons que Deus nos deu e contribua ou concorra assim para o bem dos que amam a Deus.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

SOLENIDADE NA ACADEMIA MARATAIZENSE

10 DE MAIO DE 2014

MAIS UM GRANDE MOMENTO DA ACADEMIA DE LETRAS E ARTES DE MARATAIZES E DO ESPÍRITO SNTO. 

Sob o comando da Presidente, Bárbara Péres, a Academia de Letras e Artes de Marataizes e do Espírito Santo empossa novos acadêmicos. 

Na oportunidade foi apresentado o Hino da Academia, composição de Raul Sampaio e Sérgio Dario Machado.



Neta do Acadêmico Clério Borges faz a festa!
Guilherme, neto da Acadêmica Maria Dolores Rezende


Fabiannni R. Taylor Costa 
Eliane Queiroz Au

Soraya, Silvia, Angela, Clério

Levi 
Clerio 

Suzi e Marluss 


Silvia com Bárbara. 

COMBATAMOS AS CAUSAS, NÃO OS EFEITOS

Data de 18 de novembro de 1994.

 Eu sei que tem muita gente dizendo bem feito. É isto mesmo! Ele tinha mesmo que morrer. Estou-me referindo a morte de Alexandre que matou a menina Bruna, na Serra.

Claro que não bato palmas para o que ele fez. Claro que acho que foi uma tremenda barbaridade. Mas também não acho certo que ele tenha sido morto da maneira que foi. Ser levado para uma cela, onde era presumível que seria executado. Todo mundo sabe que nas prisões há a lei da justiça pelas próprias mãos, sempre que é preso alguém que comete um delito assim, eles são, como se diz,   justiçados. É verdade que  os presos estejam dizendo que não foram eles quem o mataram, que ele já chegou ali  "todo arrebentado". Eis ai, uma verdade que dificilmente se conhecerá, porque a mentalidade reinante é a de que o que foi feito foi bem feito. E tudo é deixado para lá.

Só que não é assim que se resolve um problema de tamanha gravidade. Não é assim que evitaremos outras mortes como a da pequena Bruna, que conteremos a onda de maldade que nos rodeia, a perversidade que degenera o coração de uma pessoa e que a leva a cometer um crime de tal porte.

As causas é que precisam ser combatidas. A morte de Bruna é só uma das consequências pelas quais estamos pagando, por nos esquecermos de Deus, por não seguirmos sua lei  e porque não pomos  em prática os seus preceitos. Deus está em toda parte e vê tudo, mas os homens (quando se fala de homens, incluem-se mulheres é claro), vivem ignorando a presença de Deus. Cada dia que passa constroem casas e máquinas, onde Deus não tem vez,  fazem projetos dos quais Deus não faz parte. Ora, quanto mais nos distanciamos da fonte da Vida, mais erramos, quanto mais prescindirmos de Deus, maiores serão as nossas dificuldades, consequentemente, estaremos fazendo espaços para que os males se alastrem e depois, quem sofre tudo, somos ainda nós.

Que Nossa Senhora torne cada um de nós autêntica testemunha do amor de Deus. Que sejamos apóstolos. Que evangelizemos. Que levemos a BOA NOVA do reino de Deus, a quem ainda não O conhece.

Não é preciso ir muito longe. Evangelizemos o ambiente em que vivemos. Evangelizemos na nossa casa, no nosso trabalho. Não tenhamos vergonha de ostentar o nosso sinal da cruz. Substituamos o muito obrigado, por um sonoro Deus lhe pague. Digamos:  vai com Deus a quem se despede de nós para ir a algum lugar, acrescentemos graças a Deus, referindo-nos aos dons recebidos, se Deus quiser,  ao menor dos projetos que façamos, seja simplesmente, um bom dia, ou até logo.


São pequenos gestos, mas podem ser o começo de uma grande transformação. Creiamos nisto.

terça-feira, 6 de maio de 2014

ZONEAMENO ECOLÓGICO E ECONÔMICO

Escrito em 1999

Quando do Surgimento da Organização das Nações Unidas, os povos estavam dominados pela ânsia do surgimento de uma nova ordem mundial com foco na economia e na política.

É consequência lógica que o meio ambiente entrou entre os principais objetos de cogitação, razão porque, dispondo de recursos para serem disponibilizados para as nações que carecessem, o FMI só o fazia, mediante projetos que na sua elaboração tivessem levado em conta os impactos ambientais que causassem.

O Brasil se inclui entre os países que buscaram esses recursos e como não dispunha de normas reguladoras para a necessária aferição, usava as de caráter internacional, certamente inadequadas aos aspectos particulares da sua natureza.

Foi sob esse clima, que em 31 de agosto de 1981, era promulgada a Lei 6.938 que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, conceituando, estabelecendo princípios, objetivos, instrumentos, penalidades, seus fins, mecanismos de formulação e aplicação. Instituiu o Sistema e o Conselho Nacional do Meio Ambiente.

No art 9° a lei enumera seu instrumentos. Todos de fundamental importância.  Quer-se destacar o inc.  II,  porque é ele que trata do zoneamento ambiental.

Diz por sua vez o art 2º do Decreto nº 4.297/2002, que o ZEE é “instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de planos, obras e atividades públicas e privadas; estabelece medidas e padrões de proteção ambiental destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade, garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida da população”.

Mas apesar da lei, o Estado do Espírito Santo ainda não procedeu a tal zoneamento, quanto mais, qualquer dos seus municípios, pelo que priva-se o meio ambiente e com ele a qualidade de vida da presente e das futuras gerações.

Cada vez que os jornais noticiam chegada de empreendimentos no Estado, sinto sobressalto. Sabe-se que os poderosos executivos, quando chegam aqui, já usaram de sofisticados recursos dos quais dispõem, para escolher no nosso território,  a zona que melhor lhes convém. Com promessas de emprego às centenas, impressionam e “devagar, bem devagar, devagarinho”, vão-se aboletanndo e fazem a festa, para a qual os pobres com certeza não são convidados. Este tipo de negócio não contrata quem é mais pobre. Esses não tem qualificação e eles não podem retroceder... mesmo a custa do meio ambiente.

Chega de faz de conta... “ah mas as condiconantes para o licenciamento são muito fortes...”.  De que adianta, se falta gente para acompanhar seu cumprimento.

Como a Constituião não esclui ninguém, comecemos a cobrar de verdade esta providência. Há 28 anos[1] a legislação determina que seja feito.

Não se pode esperar, não se deve esperar.




[1] Agora, 33 anos.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

UNIÃO ESTÁVEL E CONCUBINATO

Escrito em julho de 2000

        Neologismo é palavra nova. Quando a Constituição Federal definiu como União Estável,  a entidade familiar formada por um homem e uma mulher, recomendando que a lei facilitasse sua conversão em casamento, criou um neologismo jurídico. Afirmo-o para ser bem entendida, lembrando que, seja a palavra união, como, estável, cada qual com seu significado, existiam antes da Carta Magna, foram reunidas para definir a condição de muitos conviventes em situação singular ou seja, dos que convivem sem se terem valido do contrato civil previsto em lei, mesmo na inexistência de qualquer impedimento ou ainda que lhes falte apenas, o acionamento da vontade para tanto.

        Anteriormente, denominava-se genericamente de concubinos os que coabitavam, independentemente do estado civil, isto é, de ser apenas um, ou ambos solteiros, casados ou viúvos[1].

           Mesmo com a Constituição promulgada há já seis anos, na época, 29 de dezembro de 1994, foi sancionada a Lei 8.971, cognominada lei dos concubinos.  Tratou apenas sobre o direito a alimentos e a sucessão  entre eles. Prevê que companheiro em igualdade ou reciprocidade de direitos e deveres,   desde que o outro seja  solteiro/a, separado/a judicialmente, divorciado/a ou viúvo/a, desde que conte com mais de cinco anos dessa convivência ou tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, da ação de alimentos, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.

Sobre a sucessão, definiu duas condições,  ambas de usufruto apenas, contanto que, quem sobreviveu não venha a constituir nova união. Na primeira, havendo filhos só do de cujus  ou comuns, sobre a  quarta parte dos bens;  será sobre a metade  não havendo filhos, embora sobrevivam ascendentes.  na falta de ambos, o direito se plenifica sobre a totalidade em forma de  herança, portanto, transfere-se ao sobrevivente definitivamente. Neste último caso, não se fale portanto, de usufruto ou de impossibilidade de constituir nova união.

Uma outra hipótese disposição é no sentido de que, se os bens deixados resultarem de atividade em que haja colaboração do outro companheiro ou do esforço comum, como melhor se diz, que o sobrevivente terá direito a sua meação.
       
A Lei dos Concubinos é restrita,  não tardou a necessidade de ser editada uma outra que se cognominou Lei da União Estável (Nº 9.278, de 10 de maio de 1996).  Disse a que veio, regulamentar o § 3º do art. 226 da CF. Portanto, se para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento,  como entidade familiar será reconhecida  a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.

        Logo, os unidos se devem:  respeito e consideração; assistência moral e material; além de  lhes competir a guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

        Sobre os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, afirma a lei que são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, a menos que seja estipulado em contrário, mediante contrato escrito.

        No casamento, o regime de comunhão de bens é previamente definido pelos cônjuges, via de conseqüência, o contrato citado deve anteceder à estabilidade da união, diversamente, seria estranho e injusto. Não acontece qualquer alteração no curso da união matrimonial, não pode acontecer na união estável que lhe foi equiparada.

        Há ainda a possibilidade de formação de patrimônio o qual também se torna comum, quando ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união.  Este tem um pequeno apartamento, aquele um outro, vendem os dois e compram um terceiro, por exemplo.

Na união estável, a administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito.

Como ocorre com o casamento, a  união estável também pode ser desfeita e o será mediante rescisão. Restará a obrigação de prestação da  assistência material a título de alimentos a quem dela necessitar. Toda a matéria relativa à união estável é de competência do juízo da Vara de Família, com as características próprias,  assegurado o segredo de justiça.

Note-se ainda, que ao falar de alimentos, prestados por um dos conviventes ao outro que deles necessitar,  fala de forma  prevista nesta Lei. Logo, a outra, a lei dos concubinos vale só para eles, e que, a condição de concubinos  não está contemplada nos seus termos. As situações peculiares  poderão ser resolvidas na forma anterior,  do mesmo modo com que se resolvem as dos concubinatos pré existentes à  união estável. Não podem ser por ela recepcionadas, faltam-lhes aqueles pressupostos com que a mesma união estável foi reconhecida e definida constitucionalmente.

Neste sentido, evocando ao menos nove outros precedentes, o Superior Tribunal de Justiça,  a 30 de setembro do ano passado[2] em recurso especial, acolheu  pedido de indenização por serviços prestados, em que a relação de concubinato era anterior à Lei da União Estável e à Constituição Federal, reservando para a liquidação a apuração do respectivo  valor.

Também não se olvidou a lei,  numa atitude pré pacificadora entre eventuais herdeiros de quem morreu com quem subsistir, de prever que: se dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, enquanto viver, contanto  que  não constitua nova união ou se case.

É evidente a conclusão portanto:  concubinato é uma condição e união estável, outra. Não existe concubinato puro ou impuro, conforme se esforçaram por definir alguns,  no sentido de que aquele é o que existiria entre desimpedidos para se casarem e este, ao contrário. Nas duas condições, pode ser  buscado refúgio em lei.  Ambos apresentam uma dificuldade na postulação em juízo, porque assim como não basta dizer ao Estado Juiz, eu sou casado com fulano, mas tenho que provar mediante exibição de certidão do registro respectivo do meu casamento, não basta que eu diga, vivo, convivo, desde tal dia, ou por este tempo com A.  Preciso provar[3].





[1] Em sentido lato, o concubinato representa qualquer união sexual, fora do casamento, menos estável. (Mario de Aguiar Moura – Teoria e Prática – Editora Síntese -1979

[2] INDENIZAÇÃO. SERVIÇOS PRESTADOS. CONCUBINATO.
A Turma, prosseguindo no julgamento, acolheu o pedido de indenização por serviços prestados, em que a relação de concubinato é anterior à Lei da União Estável e à Constituição Federal, reservando para a liquidação a apuração do valor. Precedentes citados: R Esp 97.811-RJ, DJ 14/10/1996; R Esp 50.100-RJ, DJ 19/12/1994; R Esp 5.099-RS, DJ 29/4/1991; R Esp 47.256-RJ, DJ 24/10/1994; REsp 62.268-RJ, DJ 2/10/1995; R Esp 108.455-RJ, DJ 7/4/1997; R Esp 14.746-SP, DJ 9/12/1991, e R Esp 85.954-SP, DJ 20/5/1996. R Esp 132.826-SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, julgado em 30/9/1999.

[3] Art. 861 - Quem pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica, seja para simples documento e sem caráter contencioso, seja para servir de prova em processo regular, exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção. (CPC)

domingo, 4 de maio de 2014

IMPORTA VALORIZAR NOSSA LITERATURA


Quando alguém gosta de fazer alguma coisa, gosta também de partilhar o resultado do que faz com as pessoas do seu convívio. Entre esses gostos se inclui o de escrever.

Há muita gente escrevendo no Espírito Santo, pouca consegue colocar na imprensa ou publicar seus escritos. Confesso que sinto uma inevitável sensação de desalento, ao chegar a uma livraria e verificar que de forma bonita, chamativa, atraente, a maioria das obras oferecidas são de autores estrangeiros que, ou repetem em outros termos histórias conhecidas, ou as colocam em outros cenários, outras terras, onde o clima é outro, são outras as realidades.

É verdade que são respostas aos anseios do nosso, muito nosso público  leitor, que julga estar em versões nem sempre autênticas o que busca, a possibilidade de saciar a sede que tem de passar boas horas de enlevo, lendo.

Não se trata de desmitificar o velho adágio: “santo de casa não faz milagre”, mas um esforço sim, que se empreende com imensurável garra no sentido de alertar que aqui são produzidas obras de igual quilate ao das melhores encontradas por ai, quando não, superior a expressibilíssima maioria delas.

No entanto, não são lidas. Na busca de visibilidade e conquista do próprio lugar ao sol, a Academia Feminina Espírito-santense de Letras, a Academia Espírito-santense de Letras e o Instituto Histórico e Geográfico reuniram forças e promovem neste mês de maio, 15 a 18, na Praça do Papa, a FLICA - FEIRA LITERÁRIA CAPIXABA.

Têm como objetivo fundamental, divulgar a autora e o autor capixabas. É grande a expectativa de que os leitores se tornem curiosos e queiram conhecer literatura genuína, produzida por capixabas por natureza ou por adoção.

Não se olvide, a grande virtude da literatura que é nossa – cada um de cada Estado, pode-se expressar assim – é retratar desde cenários, costumes, cultura e qualquer expressão vital que brota em gente, fatos acontecidos em ambiente que nos são familiares, muitas vezes nos tendo como protagonistas, com expressões e falares que caracterizam cada grupo e assim, exala perfume genuíno de coisa nossa.   

Sem dúvida, na literatura se repete a sanha de atravessar fronteiras para fazer turismo, enquanto continuam indizíveis as belezas existentes no nosso país, cujo céu se tinge de azul único, cuja linha é ainda mais reta no infinito em que o mar se une ao céu, onde “nossa vida tem mais vida, nossos bosques têm mais flores”, enquanto continua a ser verdade o que outrora disse o poeta a infantes: “não verás país nenhum como este”.

Nossa literatura é muito boa. Importa descobrir a beleza que existe nos versos da poetisa ou do poeta capixaba, quando decanta o amor ou mesmo a dor, a precisão sequencial, a melodia que sucede entre termos sucessivos ou frases chegando à composição total de uma crônica, por exemplo. 

Onde quer que alguém esteja, onde quer que a sede de cultura o surpreenda, ao seu lado está a literatura capixaba permeada do sabor do que é nosso, falando das experiências que são só nossas, registrando os fatos que fazem a nossa história, enfim, usando da palavra mediante sua expressão maior, realizar a comunicação.

Ou não nos lamentemos se quando nos lembrarmos de fatos que gostaríamos de transmitir aos filhos dos nossos filhos, não pudermos contar com a literatura muito nossa, a capixaba.


Marlusse Pestana Daher                                                           

Vitória, 22 de abril de 2014 23:25