Participei há cerca de
duas horas da solenidade de abertura do “Congresso Brasileiro de Poetas
Trovadores” que este ano se realiza nas dependências do Centro Comunitário do
bairro Eurico Sales, em Serra.
Aconteciam aqueles
momentos comuns a todos do gênero: falas, premiação, outorga de prêmios,
medalhas, quando o apresentador, quebrando o protocolo, anuncia a chegada de um
Grupo de Congo. O município de Serra é tradicionalmente pródigo em gente que
ama o cultivo dessas expressões afro descendentes. Além do Jongo, é muito forte
o jongo de São Benedito e outros.
E irrompem salão adentro,
duas adolescentes como porta-bandeiras, vestidas de branco, que ao ritmo
cadenciado dos tambores agitavam os estandartes do Grupo. Foram seguidas de um
expressivo número de tocadores de tambores, todos jovens e empolgadíssimos por
serem vistos. Jovem o Mestre, numa graduação de idades que começa pelos seis,
sete anos. Todos em harmonia total.
Os componentes da mesa
afastaram suas cadeiras para abrir espaço para a passagem do grupo. Aproveitei
que nos pusemos de pé, para ceder ao instinto de quem não consegue ouvir um
ritmo sem ceder ao doce compasso e ousar algum passo.
E assim foi, até que tendo
o grupo se postado do lado de lá,
colocou-me sob os olhos um poeta que veio das Minas Gerais. Em poesia a
Marilda, confessa-lhe “amorilda, amorilda você, desde tenra idaldida, porque
nesta vilda, impossívilda, não te amarrilda”.
Exatamente aquele tipo bem
particular, que coloca um chapéu sobre a carapinha longuete, suspensa
estrategicamente na parte de trás querendo ser ao inverso um chanel, sem faltar
em cada lado, aquele chumacinho que desce pelas orelhas. Cor bem escura, com o
escuro que as abas do chapéu acrescentavam, difícil divisar seus traços
fisionômicos.
O mesmo não acontece com o
traje claro que vestia, calça, camisa de manga comprida meio enrolada, um
colete, desses que se amarram para trás, com a frente aberta.
Indicadores em riche, as
mãos levemente fechadas, o braço em 90 graus... rodopiava, gingava, dava
passos, totalmente entregue ao ritmo dos tambores que ouvia, como se nada mais
existisse a sua volta. Completamente feliz!
Como de verdadeira visão
foi a impressão em mim causada. E aos meus passos que já eram débeis, chega uma
ordem instintiva: para e olha simplesmente.
Sem esforço, parei. De
imediato me lembrei daquela outra afrodescendente que me encantou, assistindo a
uma apresentação do jongo das paneleiras de Vitória.
Embriagada pela percussão
dos tambores tocados por homens, rodopiava por todos os lados, desvencilhava-se
das companheiras, mergulhava sob cotovelos para sair lá na frente, cantando a
plenos pulmões louvores ao santo.
Minha contemplação ficou
ali em cerca de metro quadrado, assistindo, quando minha visão, que esbarrou na
mesa, jogou medalhas no chão, espantou a
gafe, sequer permitindo que surgisse, recolheu tudo no mesmo compasso, sem
perder a pose, sem parar de dançar, levantou as mãos em “mãos ao alto”, pedindo
desculpas e seguiu em frente para não perder sequer um segundo ou o ritmo pelo
qual era embalado.
Seria no mínimo perda de
oportunidade, se eu não me tivesse assentado para melhor apreciar, todo enlevo
que possuía aquele poeta carapinha, que até por ser negro, tem ainda muito mais
capacidade de sentir e traduzir pelas emoções que de um corpo emanam o que
causa na alma, rufar de tambores em ritmo de congo.
15/11/2014