sábado, 27 de dezembro de 2014

NO CURSO DE UMA CAMINHADA



Despertei mais cedo e assim, sem outra coisa para fazer, decidi por uma caminhada que médicos sempre recomendam. Deveria tomar gosto. 

Optei por sair pela direita que me levou à travessia pela ponte “Airton Sena”, onde há sempre alguns pescadores. É a primeira parada. –Bom dia! estica-se a conversa, mostram-me a lata onde colocaram pequenas arraias, umas três ou quatro, cada um.  Mais um dedinho de prosa e prossigo com um clássico augúrio: boa continuação de pescaria, sorrimos. 

Como sempre, pequenos barcos de pesca ancorados e dispersos pelo canal, dão à paisagem um tom de mais beleza, que a luminosidade do sol projetando-se sobre as águas, acrescenta majestosamente. 

Nestas primeiras horas da manhã, o sol é também benfazejo, pelo que sua incidência sobre a pele chega a ser agradável, talvez pela  certeza inclusive do bem que   faz.

Os bares estão fechados, também, só há pouco viram sair o último freguês, hoje é sábado e só dois dias após o Natal.  

Chego à praia e atinge meu olfato odor fétido, era o caminhão de lixo que passava. Voltei, certa de que meus passos pela direção a baixo, não o ultrapassaria e assim estaria totalmente fulminado, o agradável de caminhar.
Caminho, caminho, sento num banco, deixo o sol se encarregar de nutrir a região das minhas costas com seus raios ultravioleta. E então observo. Crianças não, mas adultos há de toda idade. 

Chama-me a atenção, o balançar não comum de mãos e braços de um octogenário e o compasso firme e célere dos seus passos. Não me passa despercebido que a perna direita não tem o mesmo movimento da outra, indício de precedente desagradável, que certamente motivou-o à prática de exercícios matinais e o alegram pela conquista. 

Lá vem outro homem, nossa, que barriga enorme...  a bermuda está cintada abaixo dela... Passa exatamente à minha frente. Desvio o olhar da barriga para sua face e deparo-me com uma expressão de quem não se sente diferente pela barriga que tem e que convive perfeitamente, normalmente com ela. A admiração fica comigo. 

Desisto da contemplação do mar, posto que sempre provo uma pitada de nostalgia causada pela incidência, mar a dentro, do porto de Tubarão que da altura em que me postei, até parece que fechou o mar, transformando aquela porção de água em nada menos que simples baía. 

Em direção oposta, ah, eles, os arranha-céus! São muitos de diversas cores, variam também, ainda que não expressivamente, em altura. Vitória ficou pequena, derrubaram-se quase todas as casas da Praia do Canto e em seus lugares, construíram-se edifícios, eles permitem no mesmo pedaço de chão, morada de mais gente. 

O homem tem sede de bem viver e com dinheiro vai pensando que está comprando seu bem estar.

Que bonita vai-se tornando sempre mais esta Vitória!

Já no ponto onde espero que o sinal se feche para atravessar a rua, surge ao meu lado, um metro e quarenta, por aí, com uma velha bermuda molhada, auricular a posto, telefone na mão, dança tranquilamente ao som da música que ouve. 

Atravesso a rua, prossigo, ao final do segundo quarteirão, ouço peculiar arrastar de chinelo de borracha no cimento da calçada, não precisei voltar-me, já passava ao meu lado, aquele “hominho” caminhando e dançando, em frente, até onde lhe desse na telha e depois voltar?

A rua é pública, mesmo que seja da Praia do Canto, é que sob o sol há sempre lugar para todos e a ninguém se veda passar.  

               Marlusse Pestana Daher                                                                     Vitória, 27 de dezembro de 2014  9:40