domingo, 28 de junho de 2015

A ESPERANÇA NOS MOVE


Cardeal Orani Tempesta

Vivemos momentos complexos em nossa sociedade! Perseguições, vilipêndios, martírios, intolerâncias, fanatismos ideológicos, culturais, sociais e religiosos, laicidade mal compreendida, o Estado ocupando o lugar da família na educação dos filhos, promessas de solução da violência juvenil com encaminhamentos falaciosos, intolerância religiosa em todos os níveis e certo anticatolicismo espalhado pelo mundo. Sabemos que nesse tempo de “mudança de época”, todos estes conceitos e práticas arraigadas em filosofias e visões do mundo, que já há séculos vêm sendo fermentadas na sociedade, devem passar por uma reflexão profunda para que possamos escolher o melhor caminho para o futuro. Estamos colocados diante de uma situação que necessita de um grande discernimento.
Já há muito tempo que no Brasil e no exterior acompanhamos as manifestações de intolerância religiosa em várias modalidades e contra os mais diversos credos, mas também um aumento da violência e insatisfação com revoltas. Existe um clima da necessidade de tempos novos no ar! Eis a oportunidade de uma séria reflexão e escolhas para o futuro. Aparece um direcionamento para banir da sociedade em geral os valores humanos transcendentais e sagrados em favor de um laicismo agressivo, fanático e intolerante.
Quando recebi, no Palácio São Joaquim, na manhã do dia 19 de junho, sexta-feira, a menina Kailane Campos, de 11 anos, que foi atingida por uma pedrada na cabeça por ser reconhecida pela sua religião porque estava vestida com as roupas próprias do Candomblé, na Vila da Penha, aqui no Rio de Janeiro, além do fato pessoal, pude ver no gesto com uma criança uma terrível intolerância religiosa que chegou também em nosso país, infelizmente. No citado encontro, em nome da Arquidiocese, ocasião em pude expressar a nossa solidariedade e reafirmar sua abertura ao diálogo com outras religiões, contamos também com a presença da avó de Kailane, Kátia Marinho, que estava com a menina no momento da pedrada. Representantes da Comissão Arquidiocesana de Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso e da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa também participaram da reunião. Este foi um dos fatos dentro de tantos outros que ocorreram aqui no Brasil e no exterior.
Neste ano em que comemoramos os 50 anos da conclusão do Concílio Vaticano II é bom recordar que “a Igreja, por conseguinte, reprova toda e qualquer discriminação ou vexame contra homens por causa de raça ou cor, classe ou religião, como algo incompatível com o espírito de Cristo”. E ainda recorda, citando 1Ped 2,12: “Quanto deles depende, mantenham paz com todos os homens, de modo que sejam verdadeiramente filhos do Pai que está nos céus” (Nostra Aetate 5).
Os fatos atuais devem nos levar à reflexão e à tomada de consciência quanto ao nosso respeito pelo próximo e pelos valores religiosos que lhe são subjetivamente caros, dado que ele, na fé cândida, pratica seu culto sem prejudicar o bom andamento da reta ordem e sem desrespeitar os demais credos religiosos da sociedade pluralista em que vive. Ora, se ele respeita, por que não mereceria reciprocidade?
Aliás, a própria Bíblia, Palavra de Deus escrita, nos adverte sobre isso ao nos ensinar o seguinte: “Não faças a ninguém o que não queres que te façam” (Tb 4,15), ou “Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a Lei e os Profetas” (Mt 7,12). Não está já aqui um importante ponto de reflexão sobre a nossa conduta humana com relação a quem professa uma fé diferente da nossa?
Não pensemos, contudo, que são fatos isolados estes que estamos abordando; não, eles parecem mais ou menos organizados, como dizíamos, para derrubar tudo o que represente algo de sagrado na humanidade, a fim de dar lugar a um secularismo doentio e desumano, pois, feito para Deus, o ser humano não descansa enquanto não repousa n’Ele já, provisoriamente, aqui neste mundo e, definitivamente, na eternidade.
Nós lamentamos muitas situações de intolerância! Que se veja os martírios dos cristãos, que se reflita sobre o vilipêndio e desrespeito aos templos queimados, a imagens religiosas tanto no exterior como aqui entre nós. Em alguns lugares se proíbe e se destrói, em outros (como aqui), além de quebrar, vilipendiam como que insultando todos os que têm nesses símbolos um sinal querido e amado.
Creio que necessitamos de uma reflexão aprofundada, que gostaria de iniciar mesmo sabendo que isso merece um pouco mais de considerações. Vamos iniciar com uma abordagem sobre as orientações laicas, que desejam manipular as religiões e seus ensinamentos.
Dois pronunciamentos mais ou menos recentes nos fizeram constatar isso e, por essa razão, é oportuno que nos atentemos a eles, ainda que de passagem. O primeiro vem do Sr. Vincent Peillon, ministro da Educação na França, em 2013, com as seguintes palavras: “Até agora foi feita uma revolução essencialmente política, mas não a revolução moral e espiritual. Deixamos à Igreja Católica o controle da moral e do espiritual. Agora é preciso substituir tudo isso (...). Jamais poderemos construir um país de liberdade com a religião católica. É preciso inventar uma religião republicana que deve ir junto com a religião material, religião que, de fato, é a laicidade. E é por causa disso, aliás, que no início do século XX se começou a falar de fé laica, de religião laica” (Obedecer antes a Deus que aos homens, p. 84).
O segundo discurso é bem recente, parte da Sra. Hillary Clinton e foi proferido em 24 de abril último no Lincoln Center de Manhattan. Ali, ela expôs de modo claro que “os códigos culturais profundamente arraigados, as crenças religiosas e os enfoques culturais devem ser modificados”, desde que privem a sociedade de desfrutar da “saúde reprodutiva”, termo ambíguo denunciado mais de uma vez pela Santa Sé como fruto de engenharia de linguagem para designar o aborto.
Indo além, a pré-candidata à presidência dos Estados Unidos, na convenção de seu partido, defendeu um Estado autoritário e controlador ao declarar que “os governos devem empregar seus recursos coercitivos para redefinir os dogmas religiosos tradicionais”. Essa coerção levaria à troca dos dogmas religiosos pelos do Estado laicista e perseguidor das religiões, uma vez que estas lembram o Transcendental. Lembram que nenhum poder têm os governantes deste mundo se ele não vier do alto (cf. Jo 19,11).
A fala da Sra. Clinton causou grande repercussão nos Estados Unidos, de modo que Bill Donohue, dirigente da Catholic League, pode declarar que “nunca antes se viu um aspirante à presidência dos Estados Unidos atacar diretamente os ensinamentos da Igreja Católica”, mas até aí chegou a intolerância religiosa naquele país que sempre se arvorou em defensor das liberdades individuais ou do homem livre.
Esses discursos que não se intimidam em deixar transparecer o ódio à fé católica e cristã em geral vão além em outras falas ou escritos que também atacam a religião de uma maneira mais ampla, como se fosse ela um grande mal para a humanidade e precisasse ser extirpada a fim de que o ser humano pudesse ser feliz, segundo dizem. Na realidade, porém, se dá exatamente o contrário, conforme asseguram renomados estudiosos: a fé é um alimento propulsor da humanidade para o progresso desde a Antiguidade até nossos dias.
Sim, o sinântropo, ou o homem de Pequim, por ter os vestígios descobertos em Chou-Kou-Thien, a 50 km da atual capital da China, intriga os estudiosos por revelar três aspectos muito importantes: a) sabia produzir e usar o fogo, algo impossível a infra-humanos; b) utilizava instrumentos devidamente talhados ou trabalhados, reveladores de capacidade de invenção e reflexão, dado que preparavam um objeto com finalidades bem próprias; c) expõem grande respeito perante o mistério da morte, com ritos fúnebres, que dão a entender uma crença no além ou numa Divindade. Daí constatar Bergounioux: “Seria imprudente deduzir desses fatos (os três atrás recenseados) conclusões demasiado precisas. Contudo, é necessário registrar cuidadosamente essas manifestações de vida de uma tribo ditadas por preocupações já não meramente materiais e já características de uma consciência religiosa que veremos expandir-se e aprimorar-se no homem da etapa seguinte” (Les Relligions des Prehistoriques et des Primitifs, coleção Je sais – jê crois nº. 140. Paris, 1958, p. 14 apud E. Bettencourt, OSB. Teologia Fundamental. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2013, p. 43).
O famoso psicanalista Carl Gustav Jung, mais recentemente nos assegura o seguinte: “De todos os meus pacientes na segunda metade da vida, isto é, tendo mais de trinta anos, não houve um cujo problema mais profundo não fosse constituído pela questão de sua atitude religiosa. Todos, em última análise, estavam doentes por ter perda daquilo que uma religião viva sempre deu em todos os tempos a seus adeptos, e nenhum se curou realmente sem recuperar a atitude religiosa que lhe fosse própria” (cf. N. da Silveira. Jung: vida e obras, p. 141s).
Visto isso, não é mais possível negar o valor da religião, do sagrado entre os homens, pois sem Deus, como instância superior, o homem se torna lobo do homem e se arroga no direito de ocupar o lugar do Criador, a fim de menosprezar o seu próximo seja por ideologias de cunhos totalitários que conseguiram chegar ao governo de alguns países, seja por outras que – como a ideologia de gênero – vai tentando se implantar nos programas educacionais de nossos municípios para procurar deixar Deus e a natureza humana em segundo plano a fim de manipular o homem e a mulher segundo os caprichos desses mesmos ideólogos de plantão. Mas toda religião bem vivida se opõe a isso e a outras formas de opressão. Daí o desejo de removê-las do caminho revolucionário de qualquer modo.
Uns optam por ridicularizá-la intelectualmente, outros por persegui-la a partir de sistemas de governo autoritário, outros ainda por meio de recursos de manipulação de linguagem ou da hipocrisia verbal, que vai substituindo conceitos clássicos por novas linguagens, desejam nos fazer crer, quase sem perceber, que é necessário apagar da sociedade tudo o que ainda nos leve a Deus. Já alguns outros preferem o ataque frontal com bombas, pedras, tiros, pichações em templos, destruição de imagens ou símbolos religiosos diversos. É a intolerância em seus vários níveis e que precisa ser combatida.
Daí, em 1º de janeiro de 2011, por ocasião do Dia Mundial da Paz, o Papa Bento XVI pedia: “Diante das tensões ameaçadoras do momento, especialmente a discriminação, o abuso de poder e a intolerância religiosa que hoje atingem particularmente os cristãos, eu volto a fazer um convite premente para que não cedam ao desânimo e à resignação”. (...) “Eu exorto todos a rezar para que os esforços feitos por muitos lados para promover e construir a paz no mundo tenha um bom resultado”, dizia.
Também o Papa Francisco nos exorta: “No mundo e nas sociedades existe pouca paz, também porque falta diálogo e há dificuldade de sair do horizonte limitado dos interesses próprios, para se abrir a um confronto verdadeiro e sincero. Para que haja paz é preciso um diálogo persistente, paciente, forte e inteligente, para o qual nada está perdido” (...). “Nós, líderes religiosos, somos chamados a ser verdadeiros ‘dialogantes’, a agir na construção da paz, e não como intermediários, mas como mediadores autênticos. Os intermediários procuram contentar todas as partes, com a finalidade de obter um lucro para si mesmo. O mediador, ao contrário, é aquele que nada reserva para si próprio, mas que se dedica generosamente, até se consumir, consciente de que o único lucro é a paz. Cada um de nós é chamado a ser um artífice da paz, unindo e não dividindo, extinguindo o ódio em vez de conservá-lo, abrindo caminhos de diálogo em vez de erguer novos muros! Dialogar, encontrar-se para instaurar no mundo a cultura do diálogo, a cultura do encontro”. (Papa Francisco. A Igreja da misericórdia: minha visão para a Igreja. São Paulo: Paralela, 2014, p. 97-98).
Se essas palavras se fizerem ações em nossa vida, na de todos os líderes religiosos, ou não, certamente o mundo terá alcançado uma fase da civilização do amor e teremos menos guerra e mais paz em todos os meios, a começar em nossa casa, na nossa rua, no nosso bairro, na nossa cidade até estender-se pelo país e pelo mundo inteiro. Isso, no entanto, tem de começar de nós, de nosso coração, de dentro para fora e não o contrário.
Ainda recordando o cinquentenário do Concílio Vaticano II é bom salientar que: “... ainda existem regimes que, embora reconheçam em sua Constituição a liberdade do culto religioso, levam assim mesmo seus poderes públicos a empenhar-se em afastar os cidadãos da profissão da religião, dificultando ao máximo e pondo até em perigo a vida das comunidades religiosas” (Dignitatis Humanae 15). E ainda: “os homens todos devem ser imunes da coação tanto por parte de pessoas particulares quanto de grupos sociais e de qualquer poder humano, de tal sorte que em assuntos religiosos ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem se impeça de agir de acordo com ela, em particular e em público, só ou associado a outrem, dentro dos devidos limites” (DH 2).
Só assim será possível dizer um basta bem forte a todo tipo de preconceito religioso ou social injusto, e juntos afirmar que somos, realmente, filhos de Deus e irmãos e irmãs de verdade querendo um mundo mais justo, humano e fraterno e agindo para que isso realmente aconteça. As pedras, as intolerâncias, os vilipêndios, os martírios, os escritos ou desenhos difamando símbolos religiosos, a compreensão maldosa do estado laico e tantas outras situações nos fazem pensar sobre qual a direção de nossa sociedade. Verdi, ao escrever a ópera Nabucco em 1842, fez com que o cântico do “coro dos escravos hebreus” servisse analogamente para despertar o nacionalismo italiano quando estavam dominados por forças estrangeiras, recordando a saudade da liberdade “ó minha pátria, tão bela e perdida” sonhando com os pensamentos navegando por asas douradas! Para nós, cristãos, hoje esse anúncio é claro: é nesse momento que nós anunciamos o Cristo Ressuscitado e somos testemunhas da esperança neste mundo mudado, cansado e abatido. Cristo venceu a morte e o pecado e n’Ele nós vivemos, nos movemos e somos!


Orani João, Cardeal Tempesta, O.Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

sexta-feira, 26 de junho de 2015

IRMANDADE DOS HOMENS PRETOS

Irmandade dos Homens Pretos



A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos é uma confraria de culto afro-brasileiro, congregados em torno da devoção a Nossa Senhora do Rosário.

Origens da devoção a Nossa Senhora do Rosário

A devoção a Nossa Senhora do Rosário tem sua origem entre os dominicanos, por volta de 1200. São Domingos de Gusmão, inspirado pela Virgem Maria, deu ao rosário sua forma atual. Isto pode ser comprovado em episódios revelados em sua iconografia. A primeira irmandade do rosário foi instituída por eles em Colônia (Alemanha), em 1408. Logo a devoção se propagou, sendo levada também por missionários portugueses ao Reino do Congo.

A irmandade de Nossa Senhora do Rosário no Brasil

A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário chegou ao Brasil no século XVI. Em Santos, a igreja matriz já tem como padroeira Nossa Senhora do Rosário. No século XVII, esta mesma imagem de Nossa Senhora é a padroeira principal de Itu, Parnaíba e Sorocaba. A partir do fim do período colonial, as irmandades do Rosário passam a ser constituídas pelos "homens pretos".
No Brasil, ela foi adotada por senhores e escravos, sendo que no caso dos negros ela tinha o objetivo de aliviar-lhes os sofrimentos infligidos pelos brancos. Os escravos recolhiam as sementes de um capim, cujas contas são grossas, denominadas "lágrimas de Nossa Senhora", e montavam terços para rezar.
Registra-se as seguintes datas de fundação das Irmandades dos Homens Pretos:
A Irmandade do Rosário possuía a seguinte hierarquia: a Mesa Administrativa, o Conselho de Irmãos, a Coorte e o Estado Maior com suas Guardas. Em alguns lugares, devido à perseguição promovida pelo clero, algumas destas irmandades desvincularam-se da Igreja Católica. Mais recentemente, em algumas dioceses há uma reaproximação, através da Pastoral Afro-Brasileira.
Com quase três séculos de existência, a Irmandade do Rosário dos Homens Pretos é uma referência para movimentos de consciência negra, porque apresenta uma tradição religiosa que remonta aos tempos dos primeiros escravos. Texto de Maria José de Deus.

Irmandade dos Homens Pretos em São Paulo

A Irmandade sofreu as agruras de ver sua primeira igreja, na Praça Antônio Prado, construída em 1725 com a arrecadação de doações e esforço dos malungos (irmãos), ser demolida para dar lugar a projetos de urbanização da Província.
Os negros conseguiram manter relativo patrimônio ao redor dessa igreja, casas simples serviram para atividades religiosas, acolhimento dos alforriados e a administração da Irmandade, composta de diretoria e mesários.
Hoje, esse estilo colonial permanece nas dependências da igreja que, por ser capela, está sob a jurisdição da paróquia de Santa Ifigênia. No subsolo fica a mesa administrativa, onde os irmãos se encontram para a celebração da missa de domingo, para confraternização e para a distribuição mensal de cerca de 150 cestas básicas. Eles vivem esses momentos agradáveis e de decisões em meio a recordações, mantidas num acervo de pinturas, ilustrações, fotografias, imagens e documentos que trazem à lembrança os primeiros irmãos. "Eu me emociono e sinto um grande amor por tudo isso aqui", revela Cleofano de Barros, há 50 anos na Irmandade.
A eleição da diretoria é anual para os cargos de juiz provedor, secretário, tesoureiro e procurador, que exercem atividades administrativas e pastorais na comunidade, incentivando a formação da juventude, de equipes de música e de liturgia. Nessa ocasião, também são eleitos os festeiros, o rei e a rainha, que juntos com o juiz e a juíza organizam, durante o ano, com o apoio das irmãs e dos irmãos, as festas de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito. "A Irmandade conseguiu agregar um número considerável de afro-brasileiros. Somos cerca de 220 membros", diz o juiz provedor Marcelo Antonio Saraiva, 32 anos.
Os irmãos recebem pesquisadores, religiosos e pessoas de outros Estados e até do exterior, interessados em conhecer e estudar as razões de tanta longevidade e que ficam deslumbrados com o interior da igreja, que apresenta uma variedade de detalhes na pinturas das paredes, nas vestimentas e adornos dos santos, nas luzes do altar-mor que refletem entre lustres, candelabros e flores. "Só a devoção a Nossa Senhora foi capaz de manter-nos unidos, com a Irmandade aproximando-se dos 300 anos, e trazendo com a religiosidade, a conscientização capaz de forjar o surgimento de outros movimentos negros", esclarece a advogada e ex-deputada estadual, Theodosina Rosário Ribeiro, que já foi juíza, é mesária, e ainda faz parte da equipe litúrgica.

Tradições e festejos

A festa de Nossa Senhora do Rosário era conhecida como da Oraga, que quer dizer padroeira. Essa designação foi usada até o Concílio Vaticano II, quando as missas eram rezadas em latim e a ladainha cantada. "Há alguns anos, os festejos se estendiam até à noite, mas com a cidade de São Paulo cada dia mais violenta, preferimos realizar a celebração durante o dia", revela Jonas Gregório Lucas, mestre de cerimônia. Há 40 anos na Irmandade, Jonas acrescenta que ainda são conservadas tradições nas festas e posse dos irmãos e irmãs, quando os homens usam a opa, uma vestimenta sobre os ombros e as mulheres, fita azul sobre vestidos pretos ou brancos. No primeiro domingo de outubro, quando é realizada a festa do Rosário, a igreja vive momentos de esplendor com missa solene, coroação de Nossa Senhora, almoço para a comunidade e irmandades de São Paulo, Santos e Rio de Janeiro. Nesse dia, o povo sai em procissão pelas ruas do centro, cantando e acompanhando a banda de música, as crianças vestem-se de anjos, cumprindo as promessas dos pais, os irmãos e irmãs carregam os andores, o rei e a rainha as coroas, lembrança dos reisados e congadas. "Sinto muito alegria em ser a madrinha e responsável em levar o estandarte de Nossa Senhora", conta Lucy Mineiro, que neste ano passará a incumbência para outra irmã, já que foi escolhida para ser a rainha.


segunda-feira, 15 de junho de 2015

ACIMA DOS PAIS BIOLÓGICOS


Se Lorena obteve, mediante tramitação legal a guarda prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente sobre Davi, cujos pais biológicos são desconhecidos, ou o abandonaram, ou por qualquer outro motivo não exercem sobre ele o pátrio poder, a Lorena se aplica o art. 33 do Ecriad: “A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais”.      

Há dois anos e meio, Lorena é mãe em todos os termos e sentidos de Davi, o ama com todas as veras do seu coração, cuida, e se já não exercitou a forma mais plena, mais profunda, irrevogável que é a adoção, a culpa não é sua, mas da burocracia da justiça que se esquece de que: “toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes” e portanto importa que seja célere.

Depois de longa espera, Lorena veio a ser surpreendida com o nome de Davi entre o de outras crianças passíveis de serem adotadas por casais inscritos na Comissão Estadual Judiciária de Adoção e que segundo ordem judicial estavam liberados para a escolha.          

Não houve irregularidade na concessão da guarda e tem que ter sido observado o dispositivo estatutário segundo o qual:   “A colocação da criança ou adolescente em família substituta será precedida de sua preparação gradativa e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente, com o apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.  (§ 5° art 28)

E ainda mais: “A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, ...”. (§ 1°, art 33).

Sem pedir vênia, afirmo, ai tem coisa errada.  Quem possui a guarda ex vi legis, tem precedência na adoção que finalmente  veio a ser possível, provavelmente pela destituição do pátrio poder.

A CEJA vem cumprindo excelente papel na condução dos processos de adoção. Os juizados são bem assessorados por ela. Mas não podem olvidar que antes de tudo e sempre o cumprimento da lei depende da finalidade social a qual ela se destina e tirar uma criança dos braços de quem a tem há dois anos e meio como filha não passa de maldade.

Marlusse Pestana Daher
Promotora de Justiça aposentada e escritora.

Vitória, 1 de junho de 2015   20:50

terça-feira, 2 de junho de 2015

HABEAS CORPUS EM FAVOR DE HELTER

Exmº  Sr. Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo











HELTER QUEIROZ  SILVA, que tem em seu favor o beneplácito da cidadã ............. com respaldo inc. 48, art. 5°  da Constituição Federal[1], vem com a devida vênia impetrar em seu favor  
H A B E A S    C O R P U S
em face do Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de São Mateus – ES, por estar sendo vítima de erro e injustiça. Para tanto, suas razões são as  que seguem:

Quem é HELTER QUEIROZ SILVA, brasileiro, solteiro, nascido em São Mateus – ES, no dia 03 de fevereiro de 1995, filho de Edirlan Santos Silva e Rosania Queiroz Silva. (doc. 01), residente na Rua São José 185, bairro Sernamby, São Mateus ES?

1.     Um trabalhador que desde a adolescência vem recavando seu sustento e ainda ajudando a família, como lavador de carros em estabelecimentos formais da cidade.

2.     Desde o falecimento da avó materna, é cuidador de seu avô, Clarindo Queiroz, de 90 anos (doc 2) em cuja casa mora. Atestam esse fato as declarações a seguir mencionadas. 

3.     Ocupou-se como lavador de carro. Conforme declaração (doc 03) durante doze meses, para o Sr. Marcelo Carvalho Bonomo.

4.     Conforme doc. 4: de 14 às 19 h do dia 05 de janeiro, dia do fato,  Helter esteve a serviço do Sr. Wesley Baptisa Gaia.

5.     Pelo doc. 05, Milena dos Santos Marcelino, pelo doc. 06, Walter Souza dos Santos, pelo doc. 07, Joelson Alexandre Santos, pelo doc. 08, Tercilia dos Santos Boldrini, todos qualificados,  declaram que  Helter

É pessoa honesta, cumpridora de suas obrigações, além de exercer atividade laborativa lícita (trabalha em lava jato automotivo de nome Auto Car) cuida de seu avô, Clarindo Queiroz de 90 anos de idade, nada sabendo até o momento que desabone a sua conduta social e moral.

6.     No dia e hora da ocorrência do furto Hélter estava em uma Academia de Ginástica, conforme atesta sua instrutora, devidamente qualificada, Camila Gonçalves da Costa Pirola (doc. 09 e 9A):

Hélter esteve sob minha orientação física na Academia movimentação ... no horário compreendido entre 20 h e 21 h (vinte e vinte uma horas) do dia 05 de janeiro de 2015.

Portanto, não se trata de um dos dois elementos que promoveram o roubo.

Foi juntado aos autos da comunicação do flagrante, um vídeo em que se vê Hélter caminhando em direção da academia no horário referido. 

Hélter não é um meliante, não tem antecedentes criminais, (doc 10) foi preso por erro grave, sua prisão não foi comunicada à família, foram-lhe negados direitos fundamentais. Mesmo a Advogada que depois o “assistiu”  ali estava a chamado de outro. É muito querido pelos familiares, pelos laços de sangue e por suas qualidades,  que lhe teriam prestado toda assistência se fosse cientificada como é de direito na hora.

Todas as provas produzidas foram abandonadas, apesar dos requerimentos formulados à Autoridade Coatora, com aval do Ministério Público o que representa acolhimento de um auto de prisão em flagrante eivado de imperfeições e outros qualificativos. Senão, veja-se.
Para começo de observação. Verifique-se que as declarações (docs 11 e 12) prestadas por policiais militares que foram condutores e não testemunhas como considerados, têm absolutamente o mesmo teor. Nenhuma variação de termo ou ordem das palavras ou/e expressões. É um fato absolutamente impossível. Prova de absoluta ilegalidade, prova de montagem de acusação e cometimento irresponsável de desprezível violação aos direitos humanos que são fundamentais. 

Nestes depoimentos entre mais, é curiosa a expressão: nega ter forçado a entrega da chave da residência (de Juliano). Verdadeira precaução contra mal feito, posto que, tal acusação não consta de outro momento dos autos, portanto, por que esclarecer? 

Acrescentam (os PMs): Os policiais civis não acompanharam, tampouco determinaram  a realização de qualquer diligência  contida nessa ocorrência.

Policiais militares agindo como se fossem investigadores.

OS FATOS:

No dia 05 do corrente mês e ano, policiais militares, precisamente, os dois indevidamente denominados testemunhas dos fatos geradores de tudo que se trata,  saíram ao encalço dos autores de  um roubo de   celular, ocorrido por volta das 20 h 15 m, na Av. José Bahia, na cidade de São Mateus – ES.

Noticiaram ocorrência de um outro delito semelhante[2], mas nenhum indício de como acontecera consta dos autos, nem se procedeu a qualquer investigação para o devido esclarecimento, pelo que, autorizam a se dizer:  trata-se daquele clássico “aumentar um ponto ao conto”, infelizmente, comum na esfera policial. Ou então deve ser investigado à exaustão.

São autores do roubo: Juliano Queiroz Machado e Francisco Correia que usaram uma motocicleta de cor preta, conduzida pelo primeiro e armas de posse do segundo, encontradas em sua casa pelos policiais militares.

Após o roubo (às 20 h 15 m, do dia 05 deste mês e ano), Juliano deixou Francisco em casa e dirigia-se à sua própria, quando passando exatamente em frente a casa do paciente, a gasolina do veículo acabou e este pediu ajuda a Helter, que, inocentemente, saiu para empurrá-la, segurando ainda um dos dois capacetes que se encontravam com Juliano. 

Exatamente, nesse momento os policiais identificando a moto, prendem e conduzem os dois. Fácil imaginar o pavor provado diante da truculência e da brutalidade, por quem nada fez e de nada sabia (Hélter). A família só tomou conhecimento dois dias depois.

Juliano Queiroz Machado, (um dos autores do roubo) tem nome de família, Queiroz como o paciente, o que é apenas dolorosa coincidência. Do despacho do delegado consta que Juliano se teria referido a Hélter como seu primo. Hipótese dolorosa, pois, ambos se reservaram o direito de ficar calados. Em nenhum escrito do APF há qualquer alusão a respeito. Bem que poderiam ter investigado se a origem de tal nome tem procedência no mesmo ramo, mas pelo jeito o que interessou foi terminar um outro IP. A bem da verdade, de qualquer jeito.

Depoimento de Fernanda Brahim Afonso Santos (doc: 13)
Aos seis de janeiro de 2015 (dia seguinte aos fatos, inclusive tem-se notícia que na madrugada), segue a qualificação etc e prossegue: nesta data (6 de janeiro 2015) por volta das 20:15... repentinamente, dois indivíduos se aproximaram por trás, numa moto preta o da garupa desceu, sacou de um revólver, apontou para a declarante, ela entregou o celular, os dois se foram. ... Minutos depois compareceu à delegacia a fim reconhecer os suspeitos.

E diz que reconheceu Helter, quando na hora do roubo o relógio marcava  20 h 15 m. portanto, já noite, estando  sentada em um banco  onde existem árvores que os encobrem por acréscimo, o reconhecido usava capacete e ainda muito mais, através de fotografia. Verdadeiro olhar de lince[3]. Só pode estar enganada, e não lhe foi mostrado o verdadeiro co-autor Francisco Correia, que agora se sabe, tem semelhança física com Helter.

Nem de dia é tão fácil reconhecer alguém de capacete, quanto mais sob mira de uma arma. Impossível. 

Depoimento de Elói Daniel Racanelli (doc: 14)

Praticamente, cópia do depoimento de Fernanda de que é namorado. Cita os nomes de Juliano e de Hélter. Não lhe mostraram Francisco Correia.

Não dá suporte a validade para que Hélter esteja pagando pelo que não fez.  Basta ler atentamente o que desse palavreado consta  para se ter certeza de que, repete-se, os autores do roubo são os outros dois.
Verifica-se que o inquérito policial tão relevante e fundamental para a formação da convicção do magistrado do Ministério Público o qual deflagra a ação penal  padece de autenticidade. A sede de punir que domina brasileiros não pode chegar ao ponto de desconhecer a verdade e não ver quem realmente é culpado, sobretudo, quem em verdade é absolutamente inocente.

Tudo culmina quando no seu despacho a autoridade coatora foi lacônica não tendo fundamentado as razões que erigiu para decretar a prisão preventiva. Respalda esta afirmativa o que segue:

STJ: Prisão preventiva, onde o único motivo materialmente justificado repousava na ‘conveniência da instrução criminal’ (CPP, art. 312). Instrução terminada. Impossibilidade de manutenção da prisão cautelar, uma vez que os dois outros motivos (‘ordem pública’ e ‘aplicação da lei’) só foram invocados in abstracto. A Constituição Federal exige motivação por parte do juiz, para que o cidadão fique preso antes do trânsito em julgado de sua condenação. Não basta, assim, invocar-se formalmente, no decreto prisional, dispositivos ensejadores da prisão cautelar (CPP, art. 312).

Ao juiz cabe sempre demonstrar in concreto porque o indiciado ou acusado ou mesmo condenado necessita ficar confinado antes da hora. Recurso ordinário conhecido e provido.”

 O Excelentíssimo Juiz, ao utilizar o art. 312 do CPP como motivação para manutenção da prisão, apenas fez menção a requisitos, tais como garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.

O fundamento de garantia da ordem pública ofende princípios basilares que regem o processo penal tais como o princípio da presunção de inocência quando baseada na periculosidade do agente sem qualquer prova. Ofende, também, o princípio do devido processo legal, pois a liberdade do paciente é retirada sem que haja motivos cautelares justificadores, configurando até de puro arbítrio do julgador e os princípios do contraditório e da ampla defesa, já que apresentam argumentos impossíveis de serem refutados, não havendo possibilidade de se fazer qualquer prova em contrário.

Diante das circunstâncias, é notório que o Ilustre Magistrado se limitou a apenas pontuar o referido artigo da legislação processual, que por si só não caracteriza motivação adequada e, portanto, não é aceita no nosso judiciário, senão veja-se:

HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. ART. 312 DO CPP. PERICULUM LIBERTATIS DA PACIENTE NÃO DEMONSTRADO. ORDEM CONCEDIDA. 312 CPP I – A par dos pressupostos de prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria é preciso que exista um fato concreto a demonstrar a necessidade da medida segregatória decretada com fulcro num dos fundamentos previstos no art. 312 do CPP: garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. 312 CPP II – O fato de o paciente não residir no distrito da culpa ou a reiteração da conduta criminosa são alegações abstratas que não servem para justificar a prisão preventiva com espeque na garantia da ordem pública. III – Ordem que se concede.

(48124 MG 2006.01.00.048124-5, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CÂNDIDO RIBEIRO, Data de Julgamento: 29/01/2007, TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: 16/02/2007 DJ p.48)
EMENTA: “HABEAS CORPUS” – ROUBO MAJORADO TENTADO – PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA – DECISÃO CARENTE DE FUNDAMENTAÇÃO – GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO – PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP NÃO DEMONSTRADA – PACIENTE PRIMÁRIO – ORDEM CONCEDIDA. 

- A prisão preventiva é medida de exceção no ordenamento, e sua decretação pressupõe seja demonstrada a existência de seus requisitos legais à luz do caso concreto.
– A menção aos requisitos do art. 312 do CPP ou à gravidade em abstrato do delito não são fundamentos idôneos a autorizar o decreto de custódia cautelar se desvinculados de elementos concretos dos autos.   (Habeas Corpus  1.0000.12.092230-7/000, Rel. Des.(a) Catta Preta, 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 30/08/2012, publicação da súmula em 10/09/2012)
Com efeito, a simples gravidade abstrato por se tratar de um delito, se desvinculada de fundamentos concretos extraídos dos autos, não se presta a autorizar a decretação da prisão preventiva, pois se assim o fosse, bastaria que o paciente supostamente cometesse determinado delito.

Nesse sentido, o professor Luiz Flávio Gomes5 explana:

A prisão preventiva não é apenas a ultima ratio. Ela é a extrema ratio da ultima ratio. A regra é a liberdade: a exceção são as cautelares restritivas da liberdade (art. 319, CPP); dentre elas, vem por último, a prisão, por expressa previsão legal.

Sequer tem validade qualquer clamor público, utilizando-se do argumento de que a soltura do paciente alimentaria o sentimento de impunidade e o descrédito da justiça perante a sociedade, outra incoerência. Tal argumento não encontra qualquer respaldo legal e não constitui argumento idôneo para o encarceramento do paciente. Nessa mesma perspectiva, o STJ6 já se pronunciou:
“CRIMINAL. HABEAS CORPUS. ROUBO. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. PERICULOSIDADE DO AGENTE NÃO DEMONSTRADA. NECESSIDADE DE COIBIR NOVOS CRIMES NÃO EVIDENCIADA. RÉU PRIMÁRIO. CLAMOR PÚBLICO QUE NÃO JUSTIFICA A CUSTÓDIA CAUTELAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL VISLUMBRADO. ORDEM CONCEDIDA.
(…)
II. O juízo valorativo sobre a gravidade genérica do crime imputado ao paciente não constitui fundamentação idônea a autorizar a prisão cautelar, se desvinculados de qualquer fator aferido dos autos apto a demonstrar a necessidade de ver resguardada a ordem pública em razão do modus operandi do delito e da periculosidade do agente, reconhecidamente primário.
III. A simples menção aos requisitos legais da custódia preventiva, à necessidade de manter a credibilidade da justiça e de coibir a prática de delitos graves, assim como o clamor público não se prestam a embasar a segregação acautelatório, pois não encontram respaldo em qualquer circunstância concreta dos autos.
(...)
Sobre este assunto, o Supremo Tribunal Federal7 também faz o seguinte apontamento:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE DO CRIME. COMOÇÃO SOCIAL. FUNDAMENTOS INIDÔNEOS. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está sedimentada no sentido de que a alusão à gravidade em abstrato do crime e à comoção social não é suficiente para a decretação da prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública. Ordem concedida.

Deve ser concedida a ordem a fim de permitir, ao menos por ora, que o Paciente aguarde o julgamento do processo em liberdade, sem olvidar a possibilidade do juízo, a qualquer tempo, entendendo preenchidos os requisitos do art. 312 e seguintes do CPP, decretar com fundamentação idônea, a prisão preventiva do agente.

Não se pode deixar de apreciar a legalidade de qualquer prisão antes do trânsito em julgado sem confrontar a decisão respectiva com o texto constitucional que prevê o estado de inocência e o devido processo legal, sempre em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana. Na hipótese, a prisão cautelar não se mostra necessária para justificar esta medida de exceção.

Assim, entende-se não ter restado demonstrada a existência de periculum libertatis, razão pela qual a revogação da custódia cautelar do paciente é medida que se impõe.

Ante o exposto, evoca-se Mirate que diz:  Nada impede seja concedida liminar no processo de habeas corpus, preventivo ou liberatório, quando houver extrema urgência.
No mesmo sentido, Franco também explanou: Apesar da omissão do legislador, a doutrina processual penal, na trilha das manifestações pretorianas, tem dado acolhida à liminar no habeas corpus, emprestando-lhe o caráter de providência cautelar.

A liminar é o meio de assegurar maior presteza aos remédios heróicos constitucionais, cessando uma coação ilegal ou mesmo impedindo que ela prossiga.

PEDIDO

Diante do exposto, estando presentes o “fumus boni iuris” e o “periculum in mora”, requer se digne V. Exª de conceder medida liminar para que seja determinada a revogação da prisão preventiva imposta ao paciente HELTER QUEIROZ SILVA, acima qualificado.

Caso julgue necessário, requer o Paciente a expedição de ofício, a fim de que o MM. Juiz a quo preste as informações de estilo e, após o recebimento destas e do respeitável parecer da douta Procuradoria de Justiça, conceda este Egrégio Tribunal a ordem de HABEAS CORPUS definitiva, ratificando a disposição constitucional da presunção de inocência, expedindo-se, consequentemente o competente e necessário Alvará de Soltura em favor do Paciente HELTER QUEIROZ DA SILVA.

N. termos
P. deferimento
Vitória, 28 de janeiro de 2015
Redigido por mim.



[1] LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;

[2] ... fomos informados de dois roubos realizados na cidade de São Mateus, um no bairro ideal, outro no Bairro Boa vista conforme BU  nº...
[3] Olhos de lince é uma expressão em português que é usada para descrever alguém que tem uma visão acima da média, muito boa.