terça-feira, 1 de março de 2016

MULHER E DIREITOS HUMANOS







MENSAGEM DO PAPA BENTO XVI
AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO
SOBRE O PAPEL DA MULHER NA
PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
(VATICANO, 20-21 DE MARÇO DE 2009)


Ao meu Venerável Irmão
Cardeal Renato Raffaele Martino

Estou feliz por transmitir as cordiais saudações a Vossa Excelência e a todos aqueles que participam na Conferência internacional sobre o tema: "Vida, família, desenvolvimento: o papel das mulheres na promoção dos direitos humanos". Este evento, patrocinado pelo Pontifício Conselho "Iustitia et Pax", com a cooperação da World Women's Alliance for Life and Family, a World Union of Catholic Women's Organizations e outras associações, constitui uma resposta exemplar ao apelo do meu predecessor, Papa João Paulo II, a favor de um "novo feminismo" com o poder de transformar a cultura, imbuindo-a com um respeito decisivo pela vida (cf. Evangelium vitae, 98-99).

Todos os dias descobrimos que a vida é ameaçada de novas formas, particularmente nas suas fases mais vulneráveis. Embora a justiça exija que sejam denunciadas como uma violação dos direitos humanos, elas devem também evocar uma resposta positiva e efectiva. O reconhecimento e o apreço pelo plano de Deus para as mulheres na transmissão da vida e na educação dos filhos é um passo construtivo nesta direcção. Além disso, considerando a importante influência das mulheres na sociedade, elas devem ser animadas a aproveitar a oportunidade para promover a dignidade da vida através do seu compromisso na educação e a sua participação na vida política e cívica. Efectivamente, dado que receberam do Criador uma singular "capacidade para o outro", as mulheres têm um papel crucial a desempenhar na promoção dos direitos humanos, pois sem a sua voz o tecido da sociedade permaneceria debilitado (cf. Carta aos Bispos da Igreja católica sobre a colaboração do homem e da mulher na Igreja e no mundo, Congregação para a Doutrina da Fé, n. 13).

Enquanto reflectis acerca do papel das mulheres na promoção dos direitos humanos, convido-vos a ter em mente uma tarefa para a qual chamei a atenção em diversas ocasiões: nomeadamente, a de corrigir qualquer mal-entendido de que a cristandade é simplesmente uma colectânea de mandamentos e proibições. O Evangelho é uma mensagem de alegria, que encoraja os homens e as mulheres a desfrutarem o amor esponsal; longe de o reprimir, a fé e a ética cristãs tonam-no sadio, vigoroso e verdadeiramente livre. este é o significado específico dos Dez Mandamentos: eles não constituem uma série de "nãos", mas um grandioso "sim" ao amor à vida (cf. Discurso aos participantes na assembleia eclesial da Diocese de Roma, 5 de Junho de 2006).

Sinceramente, espero que os vossos debates ao longo dos próximos dois dias se traduzam em iniciativas concretas que salvaguardem o papel indispensável da família no desenvolvimento integral da pessoa humana e da sociedade no seu conjunto. O génio das mulheres para mobilizar e organizar dota-as de capacidades e motivações para desenvolver redes em expansão permanente, em vista de compartilhar experiências e gerar novas ideias. As realizações da WWALF e das UMOFC/WUCWO constituem um exemplo extraordinário disto, e encorajo os seus membros a perseverarem no seu serviço generoso à sociedade. Que a esfera da vossa influência possa continuar a crescer nos planos regional, nacional e internacional, para o progresso de direitos humanos alicerçados no sólido fundamento do matrimónio e da família.

Mais uma vez, faço extensivos os melhores votos para o bom êxito desta conferência, e as minhas preces para a missão permanente das organizações participantes. Invocando a intercessão de Maria, "a figura e a mais perfeita realização da Igreja"(Catecismo da Igreja Católica, n. 507), concedo-vos cordialmente a minha Bênção apostólica.
BENTO PP. XVI




O GRANDE TAPA NA CARA


Iara Bernardi

Um dado triste sobre a violência contra a mulher diz respeito ao seguinte: na maioria absoluta dos casos, seus algozes têm algum laço de parentesco ou amizade com a vítima, incluindo marido, ex-marido, companheiro, namorado, etc.
Tal constatação chega a ser lugar-comum à maioria das pessoas, pois cotidianamente ficamos sabendo de alguma mulher que foi assassinada “em legítima defesa da honra”, ou estuprada ou espancada. Porém, essa realidade, que não chega a espantar de tão comum, infelizmente, vem sendo comprovada e analisada por várias pesquisas.
Um desses estudos, que resultou num livro chamado “Primavera já Partiu – Retrato dos homicídios femininos no Brasil”, patrocinado pelo Movimento Nacional dos Direitos Humanos, levantou informações sobre a violência contra a mulher em 15 Estados brasileiros.
Os números desse levantamento indicam que, enquanto nos casos de homicídios de homens, menos de 40% das vítimas tinham relação de parentesco com seus assassinos, nos assassinatos de mulheres esse índice supera os 70%. A agressão contra o sexo feminino, portanto, na grande maioria das vezes parte de quem é próximo, o que multiplica a insegurança feminina.
O livro aponta que metade dos crimes ocorre nos finais de semana. Quanto à agressão às mulheres nesses dias, talvez a explicação esteja nas palavras de um dos entrevistados pelos pesquisadores: “O homem tem compromisso de atender à esposa pelo menos uma vez por semana (...) isso sempre acontece durante o final de semana. Se, por acaso, ela não quiser é porque está te enganando (...) e se isso fica certo não saio para procurar outra, mas essa leva pelo menos uma boa surra.”
 Em linhas gerais, o que essa e outras pesquisas apontam é que a cultura que leva a comportamentos determinantes para a chamada violência de gênero é muito comum no Brasil e está presente em todas as classes sociais, independente de raça ou religião.
Por todas essas razões, tomei um susto quando, recentemente, ouvi no rádio músicas que vêm fazendo sucesso – e, ao que tudo indica, serão hits no próximo carnaval -  e que falam que “tapinha não dói” ou, então, que a mulher gosta de levar “tapa na cara”.
Ao contrário de parecerem apenas inocentes ritmos populares, tais músicas são reveladoras de um estado de coisas extremamente negativo para as mulheres. Quando veiculadas em larga escala pelos meios de comunicação de massa, configuram estímulo para legitimação e manutenção dessa situação degradante, especialmente para crianças, adolescentes e jovens, que ainda não têm formação suficiente para “filtrar” tais mensagens.
A existência desse tipo de música já é, em si, indicativo do atraso da nossa sociedade, pois, se compositores musicais fazem obras de um conteúdo tão baixo, é porque acreditam que têm mercado, no que são, aliás, ajudados pela falta de senso crítico daqueles que a veiculam e pela indiferença ou omissão dos demais quanto ao seu conteúdo. A questão que surge ainda, nesse e em outros casos, é saber se realmente há mercado para esse tipo de coisa ou, na verdade, falta de opção das camadas populares, entupidas e condenadas a conviver com lixo cultural da pior espécie, não só na música, no rádio, mas especialmente, na TV.
O que não podemos é deixar de lamentar e protestar que a violência contra a mulher, uma temática tão cara para todos aqueles/aquelas que lutam pela igualdade de gêneros no nosso país, tenha um estandarte negativo dessa magnitude. 
Fico pensando no enorme contingente de mulheres que convivem ou conviveram em ambiente de violência ou ameaças. Em meio a um ritmo alegre e dançante, tais músicas devem soar como um grande e irônico escárnio. Para elas, tais melodias, são isso sim, um tapa na cara desrespeitoso, injusto e lamentável.
O que se espera é que as rádios e tvs que têm compromisso e respeito com a nossa cultura e as mulheres brasileiras, não toquem e nem veiculem essas músicas preconceituosas e que tentam tornar a violência contra a mulher num lugar-comum.


Iara Bernardi é deputada federal (PT/SP), Vice-líder do PT na Câmara dos Deputados e 2º Vice-presidente Nacional do PT - Visite o site na internet: www.iarabernardi.org.br - 14.02.2001