ÉTICA PARA O NOVO MILÊNIO
E aquele pecador desejou libertar-se da
imensidão de todas as suas culpas. Ao assumi-las por inteiro, depara-se com uma
dificuldade, enumerá-las. Mas está decidido,
então, queda-se penitente e diz: “senhor padre, só não matei, nem
roubei, o resto fiz tudo”.
Com certeza, muitos de nós vivemos
posando como pessoas absolutamente éticas. Afinal de contas, somos discretos em
todo nosso falar e agir, procuramos sempre dizer a palavra certa, na hora
certa, evitamos qualquer coisa que possa melindrar o outro e na nossa vida
profissional, situamo-nos sempre nos exatos limites das nossas atribuições e
até em termo de espaço.
Admitimos que a busca do lucro quanto
mais alto possível, cortar apenas aquela árvore que está diminuindo um determinado
espaço, deixar de apagar uma luz desnecessariamente acesa, não fechar uma
torneira que está pingando, atirar lixo em via pública, enfim, não poupar
qualquer gasto desnecessário, ou mesmo não evitar um esforço maior por parte de
quem quer que seja, o de quem varre a via pública, e outros tantos congêneres
são comportamentos aéticos?
Em outros tempos foi possível a famílias
viverem isoladas em uma extensão de terra, seus integrantes viverem cada um por
si e pelos demais somente, plantarem juntos para comer o que colhessem . Hoje,
quanto mais após a globalização, a interdependência parte dos indivíduos, passa pelas comunidades, cidades e nações e alcança o mundo.
Não há nada que afete um dos homens que
não repercuta entre todos. Projeta-se na longevidade dos anos e irá atingir as
futuras gerações e não se pode dizer: “por mais incrível que pareça”! É crível sim, os dados e os fatos o atestam.
Basta querer ver, ouvir, constatar.
Não basta não ser homicida ou ladrão
para não ser pecador, não basta ter-se criado uma redoma e nela ter-se
enclausurado, para se poder dizer: sou ético.
Nosso conceito de ética há de ser
revisto, precisa ser acrescido de pressupostos novos nos quais ainda não
tenhamos pensado, importa acrescentar-lhe novas nuances, dilatar-lhe os
confins, se é que ética os tem.
A onda de violência já não pode ser
debitada apenas a fatores sociais ou às causas que determinam a pobreza. A
perda de valores culturais como por exemplo, apenas para citar um, a que sofreram os povos indígenas, inclusive em relação às línguas que falavam. Por que hoje tenho que
falar português e não tupi-guarani?
Um vírus poderosíssimo infectou as
máquinas que somos, destruiu nossas reservas de outros princípios morais que detínhamos,
impede que aflorem os que se encontravam latentes e mantém muitos amordaçados.
A configuração em que se mira a
sociedade moderna carece de um esforço conjunto que determine a possibilidade do desmascaramento de tudo que
impede nossa marcha rumo ao sol. Urge crer na impossibilidade de ser feliz
sozinho e nem mesmo a certeza da brevidade da vida console, quando se tratar de
ser ético, pois, os netos dos nossos netos carecerão de um mundo mais "vivível".
Um ponto de partida pode ser a
cooperação no sentido de preservar o meio, já que “todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público (mas também a toda)
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações”. (CF art 225).
Alguns do mundo empresarial, ao menos já
estão cientes de que sustentabilidade não se separa do desenvolvimento e já não
admitem crescimento sem erradicação da pobreza.
Quem entender isto, admitirá a
necessidade de se reconceituar ética, tal qual dela carece o novo milênio que
avança sempre mais.